segunda-feira, 24 de julho de 2017

Poema - Eclipse Lunar

Eclipse Lunar














Quando eu te avistei de longe
Eu te encontrei
E lhe abracei...
Eu precisava fazer aquilo
Eu sabia do instante inexato
Da inconstância do tempo.

Tive medo que você perdesse
No meio da multidão
Por isso que eu queria levar você comigo.

Eu senti em teus olhos
Um olhar diferente
Não sei se estavas ébria da realidade
Mas pelo menos eu senti em teus olhos
Um olhar de sonhadora!

Desvelo do amanhã
Despertar da nostalgia
De quando o dia se fez sol
E de quando a noite se fez Lua!!


(Carlos André)

Crônica - Norma Jean

Norma Jean























Antes de Marilyn Monroe ser a Marilyn Monroe dos filmes e das capas de revista, ela era simplesmente Norma Jeane Mortenson (Baker), ou para os íntimos e familiares a Norma Jean: uma menina órfã, que por ter sido retirada de sua mãe Gladys, sendo que esta, no momento não estava em condições mentais de responsabilizar por teu cuidado, e, além disso, o teu pai Baker, havia abandonado-lhes, e levou teus outros dois irmãos para longe de Los Angeles. Assim, Norma Jean viveu quase toda sua infância nos orfanatos, tendo sido criada no início da adolescência pela Grace, amiga de sua mãe.

Antes de trocar a água do jarro de flores e sair lá fora para ver se na caixa de correio chegara alguma carta importante, reparei atentamente no quadro da Marilyn – foto tirada em julho de 1955 pelo fotógrafo Milton H. Greene - exposto na parede de minha sala: “ela passou maquiagem em excesso neste dia”, pensei comigo sorrindo. Não que isso não fosse permitido nos sets de filmagem, sendo que a maquiagem realçava ainda mais tua beleza. Porém, o excesso de maquiagem poderia ser um disfarce da dor; dos remédios para dormir principalmente do barbitúrico; ou do medo de não dar certo outra vez nos estúdios de filmagem, uma apreensão antes de rodar cada cena.

Depois de colocar as flores na nova água, pois aquilo fazia rejuvenescê-las, e ter me servido de um bom café quente na xícara de porcelana branca, reparei de novo naquele sorriso meigo da Marilyn, de uma suavidade refinada como a chuva passageira na tempestade. Suponho que Marilyn ligasse para o dramaturgo Arthur Miller – teu marido neste período de sua vida – para dizer-lhe sobre o roteiro do próximo filme, ou quem sabe, dando-lhe uma bronca sobre algo que passou na casa deles, em relação ao declínio de suas relações conjugais. Ou será que Marilyn chamaria o teu professor de teatro – Lee Strasberg - para recomendá-la inovações nas próximas atuações? Se bem que acredito, e bem provável que Marilyn ligasse ou mandasse um telegrama ao teu psicanalista particular, Ralph Greenson, para que este a ajudasse no momento conturbado de sua vida, e também nos momentos decisivos dos filmes que viriam, indicado-a novas sessões de análise.

Não é surpreende dizer-lhes, que Marilyn é uma das minhas atrizes favoritas do universo cinematográfico. Em destaque, dois dos meus filmes favoritos onde ela atua divinamente, além de tantos outros: “Quanto mais quente melhor” e o “Pecado mora ao Lado”. Embora não seja do meu agrado certos filmes hollywoodianos, em que já sabemos o que acontecerá no final da cena, todavia, estes são diferentes para mim, porque explicam melhor o poder de sensualidade e de humor da Marilyn Monroe, e ao mesmo tempo, a superação de Norma Jean com teu passado.

Um dia li no jornal que a biógrafa da Marilyn disse que o movimento do feminismo poderia ter salvado-a, se o ápice do feminismo tivesse eclodido antes de sua morte em 1962.  Será mesmo que poderia? Há uma compaixão e também culpa, ou seria culpa da imprensa sensacionalista pelos boatos de ser a amante do presidente John Kennedy? Claro que o movimento do feminismo fortaleceria ainda mais o desejo de liberdade e respeito diante dos papéis que Marilyn interpretaria. Mas somente o feminismo não seria tão decisivo para tirá-la dos domínios dos excessos dos tranqüilizantes; daqueles diretores que queriam usufruir de tua imagem ingênua e simples, esquecendo que atrás daquela imagem, existia uma mulher que também sentia amor e ódio, desejo e prazer. Uma simples mulher que era irreverente, mas de uma irreverência com uma dose de ingenuidade, perspicaz e humana.


(Carlos André)

Conto - O Psicanalista e a paciente Sabrine

O Psicanalista e a paciente Sabrine


















Dr. Ferdinan era um dos mais cultuados psicanalistas de sua geração. Discípulo das teorias de Sigmund Freud e Jacques Lacan, mesmo que contradizia Freud e Lacan em algumas teorias destes.  Ferdinand escreveu várias teorias acerca da aplicação hipnótica de Charcot, além de abrir as portas da psicanálise para a eficiência e a não eficiência da hipnose em algumas áreas da mente.

Houve um dia, que uma nova paciente veio lhe procurar dizendo:
- Doutor! Tenho dores insuportáveis na cabeça sempre quando acordo de um sonho, independente se este sonho foi bom ou não. O pior é que estas dores continuam, mesmo com pouca freqüência no decorrer do dia.

Só de analisarmos-lhe, já poderíamos prever o que era a dimensão do teu quadro clínico. As dores eram tão intensas como se fosse uma ponta de uma lâmina que entrasse na pele, que teu ciclo menstrual sempre variava. Aquilo não parecia ser uma cólica menstrual, e longe de ser um sintoma de gravidez. O nome da paciente era Sabrine, e logo quando Sabrine entrou no consultório, Ferdinand analisou minuciosamente tua expressão cabisbaixa, e a feição dela neste dia era de uma palidez total, que Dr. Ferdinand a disse:

- É melhor você deitar no divã. Relaxe e tente esquecer as preocupações que o cercam no momento.
- Tentarei!
- Feche os olhos, e coloque teus braços paralelos de cada lado. Respire profundamente.
- Sim, doutor!
- Não precisa ser formal aqui, lhe peço. Pode me chamar de Ferdinan, ou alguma alcunha do meu nome, caso queira. Será melhor para nossa consulta, e também pelo desenrolar da nossa conversa. Porque a formalidade pode travar algum pensamento íntimo que tenha vontade em me dizer.
- Tudo bem Ferdinan!
- Sabrine, relembre o que realmente lhe trouxe até o meu consultório, principalmente de tua última crise.
-Estava completamente dopada de remédios para dormir, antes de vim pra cá. Faz três anos que meu filho de cinco anos havia morrido. Ainda sinto uma dor intensa dentro de mim.
- Qual foi a causa da morte?
- Pneumonia!
-Tente me dizer como era tua vida antes deste acontecimento.
- Tudo era tão bom, um sonho perfeito, onde não havia dores e mortes. A alegria sempre reinava em nossa casa. Eu era casada nessa época. Sou divorciada... e.... meu marido não suportou as minhas crises. Os sonhos que eu tinha com o nosso filho, as alucinações de ver meu filho andando pela casa, dizendo: “Mamãe, olha o que eu achei no pátio”, e ele sorridente abria as duas mãos e me mostrava um filhote de pássaro, e eu dizia toda contente “Que lindo filho, mas está na hora de devolvê-lo para a mãe dele”, pois sabe doutor, quero dizer, Ferdinan, que eu também aconselhava meu filho já naquela idade sobre que certos pertences são da natureza – as lágrimas inundaram o rosto de Sabrine no momento quando relembrava desta cena – disse Dr. Ferdinan:
- As boas imagens, que também são tidas como boas lembranças são as que devemos deixar em nossa memória. Você me contou algo importante que pode ser uma das chaves do teu problema de suas terríveis enxaquecas. Conte-me sobre os últimos sonhos que você teve com o teu filho, e depois me conte sobre algum sonho em que ele não aparece.
- Teve uma noite, que estava chovendo tão forte, que abrir as janelas e respirei aquele ar gelado. Pois eu queria morrer, do mesmo modo que o meu filho.
- E teu marido, não fez algo para lhe impedir?
- Augusto?! Aquele era um ser insignificante, um traste, que só importava com teus negócios na empresa, e que só serviu para colocar Luan no mundo. Eu agradeço-o por isso.  
- Desculpe sair um pouco do rumo da conversa, mas você não o amava?
- Sim, eu o amava. Porém, tinha momentos que eu o odiava a ponto de não querer mais. Toda vez que íamos pra cama, ele queria somente satisfazer teus desejos ao invés dos meus. Nunca cheguei ao orgasmo com Augusto. Doutor, você me ama, mesmo que tenha poucos instantes que nos conhecemos?
- Sabrine, não misture a consulta com as intimidades sentimentais da vida.
- Desculpe doutor! Quero dizer, Ferdinan...
- Tudo bem, continue... e depois volte nos sonhos...
- Sim! Augusto amava Luan, mas era do jeito dele. Comprava um monte de brinquedos, empanturrava o quarto de Luan, mas carinho mesmo pouco o dava. Então, quando eu abrir a janela com a chuva, também pensei em minha infância que também foi boa. Comparei-me com Luan, aquilo que eu poderia lhe conceder que minha mãe não soubera me dar.
- O que tua mãe não soube...
- Carinho meu querido Ferdinan!
- Este é um dos bens mais valiosos para a mente Sabrine.
- Não que minha mãe nunca me abraçou, mas sempre ela me dava carinho e depois me repreendia verbalmente. Percebia que a repreensão dela era consigo mesma, com o meu pai que a largou. Assim, ela descontava tua dor de desamparada em mim. Embora hoje tenhamos uma boa relação, e ela adorava Luan e detestava Augusto. Acredita que ela me apoiou quando eu fiquei grávida? Um dia eu sonhei, e este foi o sonho diferente dos que eu tive com Luan, pois neste sonho, minha mãe abraçava-me tão calorosamente, que minha esperança aumentava quanto às expectativas da gestação.
- Compreendo muito os teus relatos Sabrine, e até aqui, tudo tem uma relação, mesmo direta ou indiretamente. Diga-me uma coisa: você sempre quis engravidar?
- Sim! Mas me arrependo de ter engravidado de Augusto. Se eu soubesse que ele não daria atenção devida para Luan, eu teria procurado outro.... e...
- Se bem que, máquina do tempo não existe. Somente nos sonhos querida Sabrine! E para terminar esta primeira sessão de análise, me diga bem resumidamente sobre teus últimos sonhos com teu filho Luan. Desculpe lhe interromper, você iria dizer alguma coisa importante?
- Não, era só uma ideia sem utilidades para nossa sessão. O que foi feito não tem como retornar e consertar. Pois bem, meu querido Nan, se assim eu posso lhe chamar. A penúltima vez que eu sonhei com Luan, este estava tão sorridente a correr de braços abertos no campo da nossa fazenda, pois morávamos na cidade, e sempre nos finais de semana íamos passear em nossa Chácara dos Sonhos Possíveis, assim chamava e ainda chama, e isto é verdade. Então, Luan corria e nunca cansava, como se aquela força de vida fosse um sopro eterno, e a morte não mais existisse. O último sonho Luan já estava triste, chorando por ter tropeçado em uma pequenina pedra e ter caído no chão. Eu não via sangue em teu rosto, somente escoriações; simples arranhões da vida.
- Sobre os remédios de dormir quero que pare de tomá-los.
- E se eu não conseguir...
- Mas você ainda não tentou!
- Sim, seguirei o que me mandas!
- Repare em tuas mudanças a partir da sessão de hoje.
- Já sinto bem aliviada das dores.
- E antes de dormir, pense sempre em momentos bons tanto de sua vida e quanto a do teu filho que foram. Tente o máximo que puder, em planejar tudo que você fará no dia, para que isso ocupe tua mente.
- Pode deixar que seguirei à risca os teus conselhos.

Quando Sabrine se levantou do divã e olhou para o Dr. Ferdinan, ela sentia um prazer enorme em poder lhe abraçar e lhe dizer o quanto aquela sessão foi importante para teu aprendizado. Tuas dores já haviam desaparecido. Sabrine se sentia leve - como um pássaro - e Ferdinan compreendeu muito mais as questões psíquicas de Sabrine. No decorrer dos meses, Sabrine foi nutrindo dentro de ti, uma intensa paixão e uma grande admiração pelo psicanalista que a libertou do jugo do passado, e agora, ela alçava voo além da superfície. Dentro dele, acredito, também crescia um sentimento por Sabrine: um coração que batia acelerado sempre quando ouvia tua voz.


(Carlos André)

Crônica - As margaridas também sentem

As Margaridas também sentem

















Percebi que ao levantar, e muito antes de pegar o jornal e abri-lo para ler as novas notícias do dia, estava absorto a olhar para a janela turva pelo início da neblina. Poder-se-ia escrever naquela janela em letras graúdas: SENTIMENTO. Naquele dia, o céu estava cinza, de um cinza insólito. Penso que o pintor adoraria ter-la em tua variedade de paletas.

Ele pintaria uma paisagem diferente, e não esta que vejo escrito hoje pelo jornal, e que quiçá, amanhã lerei com a mesma tonalidade de escrita do que fora redigido.

O que mais me contagiou de uma leveza cortante foi aquela margarida do jardim, e justo agora me lembrei da Margarida-mulher, como se eu viesse ao mundo hoje e desvendasse a luz, e no mesmo instante, que ocorria o deslumbramento, uma lâmina cortasse meu cordão umbilical que ligava a minha mãe.

A margarida, que vencia o início da neblina e que mais tarde, venceria a tempestade. Isso não estava escrito no jornal, nem tampouco nas manchetes da previsão do tempo. Pois as margaridas, além de felizes, também sentiam dor: emoção.


(Carlos André)

Crônica - A Vida é diferente através da janela do Ônibus

A Vida é diferente através da janela do Ônibus


Percebi que ao entrar no ônibus, e reparar pela janela os movimentos das luzes, dos carros, pessoas passando: indo e voltando, assemelhado a um filme assistido na grande tela da Vida, do ônibus.

Quando o frio vem e o céu fica nublado, as janelas turvas dos ônibus se enfeitam de palavras escritas, como se uma história iniciasse naquele vidro. Um talvez “te amo”, ou quem sabe “Nos vemos por aí”.

Notei, mas pouco averiguei, que as pessoas que não encontram lugar nos ônibus em dias de lotação, e ficam de pé, são pessoas que sonham de pé, leem em pé, mandam mensagens diretas ou indiretamente pelo olhar, ou por meios eletrônicos; pensam na próxima estação como um vôo alto em equilíbrio, e alguns, ansiosos, não veem à hora do ônibus estacionar no primeiro ponto, para que possam sentar, ou quem sabe ficar de pé mais um pouco. Sonhar e imaginar possíveis caminhos, onde poderia moldar ao diferente, no quase tudo igual em sentido monótono.


(Carlos André)

Conto - O Homem-lobo

Conto

O Homem-lobo


Certa vez, percorria pela cidade Sem-nome, a fama de um homem-comum, que num determinado horário do dia, quando o pôr-do-sol se despedia dos altos-montes, este homem-comum preparava-se para transformar em um lobo.

O homem-comum morava em um castelo de cartas em ruínas, nas redondezas desta tão desconhecida cidade Sem-nome, onde toda a magia da vida acontece. O nome do homem-comum? Não que eu não quisesse lhes revelar, todavia, o nome deste homem-comum, tinha algo a ver com teu lado lobo feroz. Garras na areia. Cheiro de sangue nas mandíbulas.

A família do Homem-lobo era da cidade dos Corações-gelados, aproximadamente ficava a sessenta quilômetros da cidade Sem-nome. A cidade dos Corações-gelados pertencia àqueles que eram frios, metódicos e modestos, que para certas pessoas, isso apresentava um jeito tão antiquado de se portar diante da sociedade.

Diferente da cidade Sem-nome, onde moravam habitantes que a maioria não possuía nome-comum, pois não havia cartório naquela cidade, e todos se nomeavam através de características comportamentais ou físicas. Um exemplo: havia a mulher Orquídea, sendo que teus cabelos eram vermelhos e ela sempre passava em teu corpo fragrância de orquídea. A mulher Orquídea trabalhava na padaria da esquina onde o Senhor Insensato pegava toda manhã o ônibus. O Senhor Insensato trabalhava na fábrica Cinza.

O senhor Insensato não compreendia o amor e suas vicissitudes. Não compreendia o porquê que Orquídea guardava sempre no sutiã, as cartas de seus admiradores secretos, e que depois do expediente, Orquídea lia toda empolgada para Dona Formosura, que era só formosura de só ver. Orquídea após ter lido indagava suspirando: “Será que este seria um bom marido?”.

Poderíamos chamar de uma nação civilizada, tanto a cidade Sem-nome e a cidade dos Corações-gelados. O que mais incomodava o Homem-lobo que nasceu na cidade dos Corações-gelados, é que nesta cidade, nada ali lhe atraía, até então. Um dia a mãe Proeminência, disse-lhe:

- Filho! Por que então você não procura tua felicidade! É tão angustioso ver você insatisfeito aqui em Corações-gelados, se ao menos eu pudesse lhe ajudar. Teu pai já lhe disse que se você quiser, ele conversa com o Prudente, e arranja-lhe algum afazer na fábrica Cinza.

- Mãe, melhor não! É melhor eu partir. Não quero que ninguém descubra meu segredo.

E foi assim, que o Homem-lobo despediu-se de sua mãe Bromélia, do pai Sereno e da tua irmã Hermínia. Deixou para trás uma vida. Tua cidade Corações-gelados era agora somente um retrato na parede, do castelo de cartas em ruínas.

Anos se passaram, e as transformações do Homem-lobo foram se tornando mais comuns.  Certo dia, vindo do escritório Sem-ordem, local onde trabalhava despachando documentações de famílias sem endereço, o Homem-lobo encontrou uma jovem esbelta mulher, que parecia está perdida naquela cidade Sem-nome. Ela era míope, e usava óculos para ver melhor o formato das coisas coisificadas: dos prédios, dos anúncios de refrigerantes, dos livros nas bancadas das livrarias. Além de ser bonita, ela era culta, não pelos óculos, mas por tua maneira de idealizar as palavras, e no modo de conhecer o homem. O Homem-lobo aproximou-se e a perguntou:

- Por acaso não estás perdida, estás?
- Não! Só quero encontrar a Hospedagem Sem-fim da Dona Luz.
- É ao lado daquela livaria C. Desculpe não ter me apresentado antes. Chamo-me Lobato, e sou da cidade dos Corações-gelados e moro aqui faz tempo. E o teu nome poderia dizer-me, caso não se importe?
- Meu nome é Cecília, e sou da cidade dos Velejantes.
- Muito me encanta teu nome! Nunca ouvi falar do teu nome nem de tua cidade. Infelizmente tenho que ir agora, adiantar o envio destes documentos para amanhã eu passar para o chefe - Lobato abraçou-a. Cecília, sorrindo, disse-lhe:
- Obrigado Lobato! Quem sabe nos encontramos por aí?
- Não precisa agradecer Cecília. Foi um prazer lhe conhecer. Podemos marcar algum dia de tomar café pela manhã.
- Ou um jantar! Opinou Cecília.
- Melhor não – proferiu angustiado Lobato. Pela noite fica difícil para mim, por causa do trabalho...

Cecília consentiu pelo olhar, balando a cabeça como um sinal de sim, retornando com a primeira ideia de Lobato, sobre o café da manhã.

Naquela noite, não diferente de outras noites, Lobato se transformara no lobo, deixando de ser aquele homem-civilizado. Noutro dia, conforme o combinado, eles tomaram juntos o café da manhã na livraria C. Lobato sentiu no olhar de Cecília, uma compaixão pela vida, uma serenidade no modo de tratar as dificuldades. Cecília poderia lhe ajudar a superar o teu medo com suas transformações, a equilibrar teu lado selvagem e humano. Lobato tinha medo de feri-la se contasse o segredo do lobo. Por enquanto, eles estavam ali somente para beber o simples café, e contar mais um pouco de si para o outro. Durante a noite, Lobato, - quero dizer -, o Homem-lobo uivaria pelas montanhas da cidade Sem-nome, sedento de outras manhãs.


(Carlos André)  

Crônica - Pensamentos de inverno...

Crônica

Pensamentos de inverno...

Sempre pensar em renascer de novo, no momento em que você virou a página pra saber qual capítulo lhe espera.
Sempre podemos refletir sobre as possíveis mudanças dos móveis da casa: colocar o sofá naquele canto; a mesa de jantar noutro ângulo da sala; comprar cortinas de novas cores; mudar a posição do abajur da escrivaninha; escrever outra carta endereçada a ti; passar na floricultura e comprar flores adaptadas ao frio; encomendar novos livros; escrever... escrever novas histórias.
Aqui, nada vira inutensílio.
Sempre passamos pelas estações, do casulo da lagarta, até o nascimento da ideia: borboleta.
Sempre quando observo o formato arquitetônico da Torre de Pisa e do Coliseu; das pinturas enigmáticas da Capela Sistina e da Mona Lisa, isso me faz crer no perfeito abstrato da palavra, antes de se tornar concreta.
Pois sempre quando visto a bata literária, a palavra torna-se muito mais que símbolo de uma vestimenta. Ela ressurge com mais nitidez abraçando tua origem: a LITERATURA!


(Carlos André)

Conto - Labirintos da Mente

Labirintos da Mente



























As horas daquela tarde fria se passavam tão imperceptivelmente, enquanto o ardiloso diálogo entre Irene e Plínio acontecia na cama, lugar tão quente de paixão e ardor. 

Irene era a primeira a indagar, depois de um beijo com gosto de morango, intenso e molhado:

- Plínio, você me ama de verdade?!
- Sim Irene! Por que eu não lhe amaria?
- É porque às vezes sinto você tão longe, parece que estamos em diferentes barcos, e não vejo você expressando todo o nível do teu amor por mim.
- Irene, por favor, não penses nisso. Eu te amo e isso é o que importa.
- Não, Plínio! Não quero só ser amada, quero ser compreendida. Amar também é compreender. Não sei se você sabe disso!
- Deixemos para discutir isso depois, me beije agora!

Nesse momento, Irene atendera irracionalmente o pedido de Plínio, e encostara de novo teus lindos lábios calorosos nos frios lábios de Plínio. Teve até um estalar de línguas, na mistura da saliva de um, com a saliva do outro. A felicidade de Irene não era tida como um autoflagelo da ignorância humana. Todavia, tua felicidade era pertencente à liberdade mais primordial do que nunca.

Durante o beijo, o clitóris liso de Irene se estendia; tuas pétalas de uma hora pra outra, tornavam-se úmidas, como se o mar cometesse loucuras com as marés. As marés, vindo e voltando, isso no primeiro estante – devagar -, mas agora mais forte do que a tempestade que estava por vir.

Plínio estava afetado psicologicamente com aquele início de conversa de Irene. Dava pra notar que teu coração estava aflito por dentro, tuas mãos estavam frias mais do que o comum nesta estação de inverno. Plínio também estava receoso em não querer prever no que aquele diálogo desencadearia.

Suponhamos que se Plínio traísse Irene, e esta o encontrando num restaurante acompanhando de tua nova amante, o que passaria pela mente de Irene? Irene pegaria um garfo da mesa de algum cliente e tentaria matá-los? Até então, não sabemos do nível emocional e psicológico de Irene em determinadas situações.  

Por isso que sempre digo aos meus pacientes: amem-se e não se matem. Respire no contar até três. Pois cada ação, seja ela tenebrosa ou de bom agrado, pode resultar em uma reação que na maioria dos casos, será irreversível, e em certos drinks, de uma tacada só: reversível na mudança inovadora de perspectiva quanto aos relacionamentos.


(Carlos André) 

Crônica - O Sabor do Vinho, da Vida!

Crônica

O Sabor do Vinho, da Vida!

















A garrafa de vinho, guardada muitos anos da última safra, que estava sobre a mesa, e justo agora resolvi beber. 

Um dia li no jornal a verdade subtendida diante dos fatos. Daqueles acontecimentos de quando a chuva principiou a cair, foi quando todos em sintonia abriram os guarda-chuvas.

Coitados! Eles estavam tão amargurados, dependurados no cabide do armário, torcendo para que a chuva viesse avassaladoramente. Que deus cuide para que os telhados não lhes ouvissem.

Aquilo parecia uma coreografia, no momento que vi a chuva resplandecer dentro de ti; contemplando um pouco o que havia dentro de mim. Pouco detalhado, porém, convincente; e eu, com a taça de vinho na mão, sorvi o primeiro gole, antes dos minutos iniciais da Ópera “Carmina Burana”. 


Os livros lidos, relidos, trelidos, se encontravam na cômoda com teias de aranha. Teias de aranha também se desenhavam nos olhos da boneca de porcelana. Disseram-me que o teatro, que também é mágico, principia agora. Esqueci de ler a previsão do tempo, suponho que seja por isso que ela não veio.


Na semana passada, eu te vi, mas não lhe conheci. Parece que você estava mais sorridente do que o normal. O que você me diz? Pois nossas forças não se exauriram. Tomara que as luzes que enaltecem os jasmins teçam tuas flores, porque as bromélias não têm mais dores por aqui. Então, que não percamos o foco, a eloqüência de luz.


(Carlos André)

Conto - Hortência

Hortência

Mulher determinada esta Hortência. Quase sempre não se desvanecia. Hortência era menina, menina mulher. Uma jovem na verdade, com suas vinte e oito primaveras. Uma jovem com tendência a ser adulta.

Todos os dias – ou quase todos os dias – Hortência lia debruçada sobre a relva. Nos intervalos, fazia daquilo tudo um piquenique: mordia o pedaço da maçã, que não era dos livros, mas da realidade, como se saltasse para fora dos livros. Saboreava uma parte do melão com gosto de jabuticaba, e relembrava de tua infância.

Quando criança adorava sonhar de braços abertos na relva.  Pensava nas possibilidades que existiam de afinidade, entre ela, e o autor daquele livro.

Hortência - sempre, ou quase sempre – ia ao cinema e chamava sua amiga Natty.  Natty era diferente de Hortência, pois Natty não era aventureira nas palavras, nos livros de cabeceira. Natty era aventureira nos gestos, no olhar, era muitas vezes objetiva do que a intensa subjetividade de Hortência, que era aquela mulher voltada para a sua criativa imaginação.

Ao contrário de Natty, Hortência sofria com certos desencantos da vida. Um exemplo: Hortência mal enamorava nos primeiros dias, que no último dia da semana, idealizava que este seria teu futuro marido. No final, Hortência descobriu que ele tinha outra no coração. Vai saber o que passava no coração de Hortência. Têm vezes que o coração começa a pensar mais do que a mente. Deixemos de lado esta história e vamos para outra.

Certo dia, Hortência foi convidada para a festa de aniversário de sua amiga Mary, que diferente de Natty, era aventureira em esbanjar vaidades. O que falar da cama repleta de presentes quando ela chamou Hortência e Natty para ajudá-la a desembrulhar.

Só foi pisar o pé no limiar da porta, que Mary se voltou para Hortência e Natty, e proferiu em êxtase:

- Vejam só...quantos presentes eu ganhei!!!! Isso não é uma maravilha? Todos esses presentes demonstram que sou uma mulher prendada, e muito popular, principalmente com os garotos.

Hortência estava quase explodindo de raiva, não diria inveja amarga, pois ela pouco sentia. Estava quase a dizer para Mary: “Amiga, melhor você jogar teu excesso de vaidade pela janela, e trazer de volta e em abundância, tua humildade”, mas Hortência se conteve, e bem lograva em retornar para casa, voltando tua atenção para o livro que tinha começado a ler.

A Natty? Não sei o que pensava no momento. Ambas, tanto a Hortência e Natty se contentavam em dizer: “Que lindo amiga!”. Porém, pelos gestos, suponho que Natty olhasse de esguelha, com desprezo para aquela atitude mesquinha da Mary.

O aniversário chegou ao fim. Todas as luzes do apartamento se apagaram, pois era de descanso. Hortência retornou para a casa sem revelar o que passou pela tua mente no momento dos presentes espalhados na cama e atitude pouco.

Ao amanhecer, quando o sol tangeu as montanhas e os picos gelados, e saldara também os ímpios, estava lá Hortência, debruçada sobre a relva, lendo teu outro livro, mantendo uma relação íntima com o autor daquela história diferente daquele, de outro dia. Se procurar e não encontrá-la, pouco importa caro leitor arguto.  Hortência muitas vezes podia está dentro do livro, e no momento em que poucos esperavam, Hortência podia saltar do livro para a realidade, como agora!

(Carlos André)