A minha primeira impressão
ao terminar de ler “O Peso do Pássaro Morto” (2017, Editora Nós), da escritora
paulistana Aline Bei, foi uma impressão daquelas bem fortes, como se no meu
lado direito houvesse um quadro impressionista de Monet, representando toda uma
suavidade romântica da paisagem, dos lagos e dos campos floridos; e do meu lado
esquerdo, houvesse um quadro naturalista de Goya delineando os espaços dessa
paisagem de Monet, com uma carga de brutalidade nada romântica; do “peso” que
poderão ter as escolhas que fazemos em nossas vidas.
Aline soube com maestria,
guiar o leitor nesses meandros do que chamamos de existência humana, ou
propriamente existencialismo sartreriano, para alguns.
A personagem (que não sabemos
o nome, e isso é um trunfo literário magnífico, para aqueles que gostam de
definir só com um nome, uma pessoa) do romance poema, ou poema romance - e
notemos que o importante aqui, não é delimitar em definir o que é exatamente
prosa do verso -, pois ambas, seja a prosa ou o verso, misturam-se; são carnes
do mesmo sangue, porém, com diferentes maneiras de ocupar o espaço na linha, do
papel, do livro; que também no livro não há linhas, então não há regras, e se
há regras, fomos “nós” que a inventamos.
Inventamos a nossa própria
maneira, mesmo com certas influências em outros literatos, de se fazer
Literatura. Pois é preciso olhar pra trás (sim), para vermos o que foi feito,
para fazermos de outra forma, do nosso próprio jeito.
Falando em influências
literárias, este romance em poema, me fez lembrar a escrita do fazer contínuo
dentro das utilidades que existem na natureza de Manoel de Barros, junto da
completude dentro do espaço da pequenez de um verso de Paulo Leminski (o chamado
haicai). Posso até está errado, e a Aline pode me corrigi caso eu esteja, mas
acredito que a romancista Aline Bei bebeu um pouco na fonte de um dos dois, ou
dos dois, alado da dureza e leveza angelical da Clarice Lispector.
O “peso” de maturidade do
romance, que no início é narrada a infância da personagem, esse peso fica meio
escondido, pronto para dar o bote na hora certa, nas virtudes do universo
pueril da personagem, que na sua tenra idade, ainda não está preparada para
saber do porquê de tantas coisas acontecerem ao seu redor, sem que ao menos ela
tenha uma explicação verdadeira para aquilo ocorrer.
Para finalizar, ocorrem-me
algumas indagações com o meu “eu” lírico interior: e o velho sábio Luís? Nem
sempre a personagem terá o seu “Luís” para a vida toda. E a sua melhor amiga de
infância, a Carla? Nem sempre as vidas cruéis cortadas nos dentes afiados do
cachorro, podem devolver de volta o nosso presente de muito esmero, ou quem
sabe uma relíquia guardada num baú, debaixo da cama que há séculos está ali. E
as cartas, elas sempre caem no endereço certo? Isso se o vento permitir. Se não
tivesse ocorrido no ápice da adolescência, a fase adulta da personagem seria
outra? Bem provável que haveria outros rumos, diferentes dos que foram tomados,
mas ela não tem culpa; sim, há um “peso” de ira na barriga. E o carrasco do
Pedro, onde ele está agora? Ele fugiu para bem longe, e ela não quer pensar,
nem sentir mais o cheiro horripilante e desprezível dele (não há amor no que é
forçado). O Lucas saberá no futuro da verdade? Somente aquele homem perto do
túmulo, pode lhe dizer o PESO do PÁSSARO MORTO!!
(Carlos André)