Capítulo
XXXI – O descobrimento dos dois mundos;
- Alfred, nos presentei com
a leitura de sua redação a respeito do descobrimento do Brasil! – Convidava o
professor Pietro (amigo comum da família) para que Alfred viesse na frente e
lesse sua redação para que seus colegas ouvissem.
- Va bene professore Pietro!
– Alfred, antes de se levantar, olhava nas linhas das duas palmas de sua mão: a
direita com o formato de um K, e a esquerda com o formato de um M (ele começou
a ter essa mania, desde quando Pérola lhe enviou a primeira carta de Paris), e atendendo
ao pedido da leitura, ele lia a redação:
“Na verdade, se analisarmos
os viés da questão, aquilo não foi exatamente um descobrimento, e sim...” a
Magda, que sentava na mesma fileira e numa carteira atrás da de Alfred, se
entusiasmava, vertia nos gestos e no olhar, um agrado do estilo inovador da
escrita de Alfred.
Magda, desde a partida de
Pérola para Paris, foi a que mais se aproximou de Alfred na turma do Primeiro
Ano “A”. Na turma (que saíram alguns e entraram outros desde a sexta série),
quase todos simpatizavam pelo talento extraordinário de Alfred, exceto, o
Matteo Vitale, que era esguio, e o Isac Salvatore de feição carrancuda e
corpulenta (ambos tinham uma linhagem italiana naquela turma), que não chegavam
a confessar, mas por dentro acreditavam e torciam veemente para que Alfred
fosse um fracasso na carreira de pianista.
- Grazie, mio caro! Gostei
desta sua articulação diante de um texto crítico-reflexivo que você escreveu.
Agora, pode se assentar! – Elogiava o professor Pietro ao jovem Alfred e logo
emendava – Convido para vim aqui na frente o Isac Salvatore!
- Eu não professor! – Se
negava a ir um daqueles que detestava o Alfred.
- Por que não Salvatore? –
Inquiria o professor Pietro.
- Por que não!
- Eu te pedi uma resposta
que justifica a sentença, e não uma negativa!
- Meu texto é uma negação,
professor! – Salvatore, que fedia chulé nos sapatos, tentava se justificar, mas
não conseguia de jeito algum convencer o professor Pietro.
- Para isso, precisamos
ouvir sua redação, pois só assim veremos se é ou não é uma negação como você
diz – Utilizava-se da boa oratória o professor de redação e literatura.
- Mas é que...
- É o que?!
- Professor, eu...
- Diga a verdade Isac Salvatore!
- Eu não fiz a redação: é
isso e pronto! – Todos na sala nesse momento, soltaram uma gargalhada que se
ouvia na sala nove, no corredor e até no pátio. Seus colegas talvez não soubessem
dos motivos que o fazia ser assim. Analisemos: Isac Salvatore quase sempre acordava
em cima da hora, chegava atrasado aos seus compromissos; lavava o uniforme uma
vez no mês (e olhe lá!); quando se estressava e a mãe ou o pai o perguntava o
porquê, ele respondia-os com nomes horrendos, sem contar que tentava seduzir a
Marieta (que sentava lá atrás) que não dava a mínima atenção para ele.
- Então, Isac Salvatore! O
único jeito será te conceituar com um zero de descomprometimento do exercício.
- Não, professor!!!!
- Tenho que fazer isso
Salvatore! Senão, eu descumpro a minha regra número 1: não fugir fora dos meus
padrões pedagógicos. Vamos vê se na próxima vez, você não vá falhar nas
atividades extraclasses.
- Eu prometo que não
falharei, mas me salve pelo menos desta atividade!
- Non posso e non dovrei!
Non ti preoccupare caro studente, seu nome já tem um significado de que em
algum momento, você irá se salvar...salvare. Credo, forse!
- Perdonami, prego...
- Non, Salvatore! Da próxima
vez, tragam os exercícios que lhe peço! Agora, que venha aqui na frente o
Matteo!
- Eu também não fiz
professor!
- Este também é outro buon
Dio! Não sei onde vocês irão chegar.
- Eu sei: seremos melhores
do que você Pietro! – Disparava Isac Salvatore, sem ao menos avaliar o peso do
que dissera.
- Sì, Salvatore! Eu espero
que seja, embora vocês tenham que melhorar em muitas coisas, e uma delas é a:
humildade e a honestidade. Palavras primas, mas que se difere em suas ações. Meninos,
viremos a página. Agora, querida Madga, nos brindem com la sua scrittura!
- Sim, professor Pietro! –
Dizia Magda levantando da carteira, e se direcionando na frente. Magda lia:
“Antes de tudo, nós
brasileiros, devemo-nos descobrir quem realmente somos a cada dia que olhamos
no espelho...”; Magda, que no fim da leitura, se contentara com a reação da
turma e do professor Pietro, olhava diretamente para Alfred, como se quisesse
consiga mesma: “Alfred, grazie pelas aulas de redação”. Ambos se ajudavam na
hora do recreio: Magda ensinava para Alfred alguns conceitos de química, física
e trigonometria, e Alfred ajudava-a nas matérias de português, literatura e
redação.
Naquele dia, quando Alfred
chegou na sua casa, Margaret, que estava tão ansiosa em dar a notícia para a
família, abraçava o irmão logo quando o viu entrar, e dizia:
- Alfred, eu tenho una
notizie extraordinária!
- Qual é a notícia?! Não me
esconda nada Margaret. Conte-me tudo!
- Espere o nostro padre e
mostra madre chegarem, que eu contarei a todos. Você também Luíza! – Margaret
convidava com olhar carismático para que Luíza deixassem os afazeres no
momento, e se juntassem a eles.
- Nos conte Margaret! Eu
ainda tenho que terminar de passar pano nos quartos, e depois terminar de
estudar a matéria que cairá na prova de hoje!
- Não se preocupe Lú! Dará
tempo você passar pano e estudar. Se você quiser eu te ajudo na arrumação dos
quartos. Minha mãe non se importará. Eles já estão chegando, vamos esperar –
Dito e feito! Margaret foi terminando de falar, dito e feito: Leocádia e
Armênio chegam, vindos do Jornal Um novo Olhar, que antes era Jornal O Novo
Olhar, porém, com o acréscimo do artigo indefinido “um”, tornou-se Um novo
Olhar.
- O que foi que aconteceu?! Por
que a cara de espera? – Analisava Armênio.
- Pai, eu tenho una notizia
straordinaria para contar a “vocês”!!
- Poi nos conte figlia mia!
– Leocádia solicitava-a.
- Eu fui uma das aprovadas
para dançar o Lago dos Cisnes! – Margaret, que com a pele esbranquiçada
ruborizava ao dar a notícia, despejando os pormenores da notícia em cada canto
da sala – Só que para isso, eu terei que fazer uma excursão de um mês em Moscou!
- Por que em Moscou, e por
que um mês de excursão? – Inquiria Leocádia, assustada com a notícia, sem se
ater na verdadeira relação que havia entre Moscou e a arte do balé.
- É porque lá se encontra a
melhor escola de balé do mundo, e nossa professora Valéria conseguiu essa
excursão pra nossa Companhia! E um mês seria o necessário para que estudássemos
as variações dos passos que ocorrem no original. Prego, eu quero tanto ir. Além
do mais, é com tudo pago. Minhas amigas estão contando que eu vá. Os pais delas
deixaram.
- Figlia mia! No momento, a
Rússia está numa situação política e diplomática muito difícil para se lidar –
Armênio tentava diminuir ou apagar o fogo de entusiasmo da filha.
- Ma papà!! – Implorava
Margaret.
- Figlia, prego! Não nos
peça isso. Eu nem sei como eu ficaria aqui, sem saber notícias suas de
imediato, do outro lado do continente – Leocádia proferia colocando uma das
mãos na testa.
- Va bene!! Grazie per la
comprensione! – Margaret ironizava a decisão tida pelos pais, e cabisbaixa,
saía da sala indo em direção ao quarto. Margaret não chegou a chorar na frente
deles, no entanto, abraçado no cobertor, pois o início da tarde
belo-horizontina, na parte pacata do bairro de Santa Tereza estava fria... e algumas
lágrimas tímidas ensaiavam em descer do seu rosto gracioso. Podemos comparar
esta cena, com o descanso das asas de um anjo, que também pudesse se encontrar
triste em seu recanto, amargurado pela decisão tomada por seus superiores.
Margaret ainda não compreendia a dimensão da preocupação maternal e paternal
que havia ali.
- Alfred, vá lá acalmar sua
irmã! – Leocádia pede.
- Sì, madre! – Alfred,
depositando a mochila no sofá, partia em direção ao quarto da Margaret.
Percebendo que Margaret havia trancado a porta, ele pede – Margaret, ti prego,
per favore apri la porta! – Escutando a voz do irmão, Margaret, se descobrindo,
levanta da cama e antes de abrir a porta, indaga:
- É só você que está aí?
- Sì, solo io!
Assim, Margaret deixa o
irmão entrar no quarto, como se o quarto fosse o símbolo, de conseguir a chave
para entrar no coração, e definitivamente compreendê-lo no seu descobrir!
(Carlos André)