segunda-feira, 27 de novembro de 2017

Novela - O PIANISTA

Capítulo XXXI – O descobrimento dos dois mundos;

- Alfred, nos presentei com a leitura de sua redação a respeito do descobrimento do Brasil! – Convidava o professor Pietro (amigo comum da família) para que Alfred viesse na frente e lesse sua redação para que seus colegas ouvissem.
- Va bene professore Pietro! – Alfred, antes de se levantar, olhava nas linhas das duas palmas de sua mão: a direita com o formato de um K, e a esquerda com o formato de um M (ele começou a ter essa mania, desde quando Pérola lhe enviou a primeira carta de Paris), e atendendo ao pedido da leitura, ele lia a redação:

“Na verdade, se analisarmos os viés da questão, aquilo não foi exatamente um descobrimento, e sim...” a Magda, que sentava na mesma fileira e numa carteira atrás da de Alfred, se entusiasmava, vertia nos gestos e no olhar, um agrado do estilo inovador da escrita de Alfred.

Magda, desde a partida de Pérola para Paris, foi a que mais se aproximou de Alfred na turma do Primeiro Ano “A”. Na turma (que saíram alguns e entraram outros desde a sexta série), quase todos simpatizavam pelo talento extraordinário de Alfred, exceto, o Matteo Vitale, que era esguio, e o Isac Salvatore de feição carrancuda e corpulenta (ambos tinham uma linhagem italiana naquela turma), que não chegavam a confessar, mas por dentro acreditavam e torciam veemente para que Alfred fosse um fracasso na carreira de pianista.

- Grazie, mio caro! Gostei desta sua articulação diante de um texto crítico-reflexivo que você escreveu. Agora, pode se assentar! – Elogiava o professor Pietro ao jovem Alfred e logo emendava – Convido para vim aqui na frente o Isac Salvatore!
- Eu não professor! – Se negava a ir um daqueles que detestava o Alfred.
- Por que não Salvatore? – Inquiria o professor Pietro.
- Por que não!
- Eu te pedi uma resposta que justifica a sentença, e não uma negativa!
- Meu texto é uma negação, professor! – Salvatore, que fedia chulé nos sapatos, tentava se justificar, mas não conseguia de jeito algum convencer o professor Pietro.
- Para isso, precisamos ouvir sua redação, pois só assim veremos se é ou não é uma negação como você diz – Utilizava-se da boa oratória o professor de redação e literatura.
- Mas é que...
- É o que?!
- Professor, eu...
- Diga a verdade Isac Salvatore!
- Eu não fiz a redação: é isso e pronto! – Todos na sala nesse momento, soltaram uma gargalhada que se ouvia na sala nove, no corredor e até no pátio. Seus colegas talvez não soubessem dos motivos que o fazia ser assim. Analisemos: Isac Salvatore quase sempre acordava em cima da hora, chegava atrasado aos seus compromissos; lavava o uniforme uma vez no mês (e olhe lá!); quando se estressava e a mãe ou o pai o perguntava o porquê, ele respondia-os com nomes horrendos, sem contar que tentava seduzir a Marieta (que sentava lá atrás) que não dava a mínima atenção para ele.
- Então, Isac Salvatore! O único jeito será te conceituar com um zero de descomprometimento do exercício.
- Não, professor!!!!
- Tenho que fazer isso Salvatore! Senão, eu descumpro a minha regra número 1: não fugir fora dos meus padrões pedagógicos. Vamos vê se na próxima vez, você não vá falhar nas atividades extraclasses.
- Eu prometo que não falharei, mas me salve pelo menos desta atividade!
- Non posso e non dovrei! Non ti preoccupare caro studente, seu nome já tem um significado de que em algum momento, você irá se salvar...salvare. Credo, forse!
- Perdonami, prego...
- Non, Salvatore! Da próxima vez, tragam os exercícios que lhe peço! Agora, que venha aqui na frente o Matteo!
- Eu também não fiz professor!
- Este também é outro buon Dio! Não sei onde vocês irão chegar.
- Eu sei: seremos melhores do que você Pietro! – Disparava Isac Salvatore, sem ao menos avaliar o peso do que dissera.
- Sì, Salvatore! Eu espero que seja, embora vocês tenham que melhorar em muitas coisas, e uma delas é a: humildade e a honestidade. Palavras primas, mas que se difere em suas ações. Meninos, viremos a página. Agora, querida Madga, nos brindem com la sua scrittura!
- Sim, professor Pietro! – Dizia Magda levantando da carteira, e se direcionando na frente. Magda lia:

“Antes de tudo, nós brasileiros, devemo-nos descobrir quem realmente somos a cada dia que olhamos no espelho...”; Magda, que no fim da leitura, se contentara com a reação da turma e do professor Pietro, olhava diretamente para Alfred, como se quisesse consiga mesma: “Alfred, grazie pelas aulas de redação”. Ambos se ajudavam na hora do recreio: Magda ensinava para Alfred alguns conceitos de química, física e trigonometria, e Alfred ajudava-a nas matérias de português, literatura e redação.

Naquele dia, quando Alfred chegou na sua casa, Margaret, que estava tão ansiosa em dar a notícia para a família, abraçava o irmão logo quando o viu entrar, e dizia:
- Alfred, eu tenho una notizie extraordinária!
- Qual é a notícia?! Não me esconda nada Margaret. Conte-me tudo!
- Espere o nostro padre e mostra madre chegarem, que eu contarei a todos. Você também Luíza! – Margaret convidava com olhar carismático para que Luíza deixassem os afazeres no momento, e se juntassem a eles.
- Nos conte Margaret! Eu ainda tenho que terminar de passar pano nos quartos, e depois terminar de estudar a matéria que cairá na prova de hoje! 
- Não se preocupe Lú! Dará tempo você passar pano e estudar. Se você quiser eu te ajudo na arrumação dos quartos. Minha mãe non se importará. Eles já estão chegando, vamos esperar – Dito e feito! Margaret foi terminando de falar, dito e feito: Leocádia e Armênio chegam, vindos do Jornal Um novo Olhar, que antes era Jornal O Novo Olhar, porém, com o acréscimo do artigo indefinido “um”, tornou-se Um novo Olhar.
- O que foi que aconteceu?! Por que a cara de espera? – Analisava Armênio.
- Pai, eu tenho una notizia straordinaria para contar a “vocês”!!
- Poi nos conte figlia mia! – Leocádia solicitava-a.
- Eu fui uma das aprovadas para dançar o Lago dos Cisnes! – Margaret, que com a pele esbranquiçada ruborizava ao dar a notícia, despejando os pormenores da notícia em cada canto da sala – Só que para isso, eu terei que fazer uma excursão de um mês em Moscou!
- Por que em Moscou, e por que um mês de excursão? – Inquiria Leocádia, assustada com a notícia, sem se ater na verdadeira relação que havia entre Moscou e a arte do balé.
- É porque lá se encontra a melhor escola de balé do mundo, e nossa professora Valéria conseguiu essa excursão pra nossa Companhia! E um mês seria o necessário para que estudássemos as variações dos passos que ocorrem no original. Prego, eu quero tanto ir. Além do mais, é com tudo pago. Minhas amigas estão contando que eu vá. Os pais delas deixaram.  
- Figlia mia! No momento, a Rússia está numa situação política e diplomática muito difícil para se lidar – Armênio tentava diminuir ou apagar o fogo de entusiasmo da filha.
- Ma papà!! – Implorava Margaret.
- Figlia, prego! Não nos peça isso. Eu nem sei como eu ficaria aqui, sem saber notícias suas de imediato, do outro lado do continente – Leocádia proferia colocando uma das mãos na testa.
- Va bene!! Grazie per la comprensione! – Margaret ironizava a decisão tida pelos pais, e cabisbaixa, saía da sala indo em direção ao quarto. Margaret não chegou a chorar na frente deles, no entanto, abraçado no cobertor, pois o início da tarde belo-horizontina, na parte pacata do bairro de Santa Tereza estava fria... e algumas lágrimas tímidas ensaiavam em descer do seu rosto gracioso. Podemos comparar esta cena, com o descanso das asas de um anjo, que também pudesse se encontrar triste em seu recanto, amargurado pela decisão tomada por seus superiores. Margaret ainda não compreendia a dimensão da preocupação maternal e paternal que havia ali.
- Alfred, vá lá acalmar sua irmã! – Leocádia pede.
- Sì, madre! – Alfred, depositando a mochila no sofá, partia em direção ao quarto da Margaret. Percebendo que Margaret havia trancado a porta, ele pede – Margaret, ti prego, per favore apri la porta! – Escutando a voz do irmão, Margaret, se descobrindo, levanta da cama e antes de abrir a porta, indaga:
- É só você que está aí?
- Sì, solo io!

Assim, Margaret deixa o irmão entrar no quarto, como se o quarto fosse o símbolo, de conseguir a chave para entrar no coração, e definitivamente compreendê-lo no seu descobrir!


(Carlos André)

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