segunda-feira, 27 de novembro de 2017

Novela - O PIANISTA

Capítulo XLVI – A pergunta insistente de Líria!

Era 2046, e a ciência nanorobótica já estava em constante evolução. A utilização das células-tronco já era possível em várias calamidades que assolavam a humanidade. Do outro lado, humanos ainda insistiam na confecção de bombas atômicas e radioativas. Crescia a crise de abastecimento de água potável, nas regiões onde extraíam o petróleo.

Enquanto isso, no bairro pacato de Verona, havia uma criancinha, a pequena Líria, que existentemente pedia o seu avô, para lhe contar uma história, antes dela ir dormir:

- Está, bem... minha... querida Líria! – Dizia pausadamente o avô, que com oitenta e dois anos, arrastava cansado as palavras, mas fazia de tudo para alegrar a neta.
- Ebaaa!!! – A Líria se alegrava, pois sabia que sempre as histórias que seu avô contava fazia sua imaginação ir longe, como se fosse em contos de fada.
- Essa história, que te tocarei agora, começa no parque, onde um certo menino... se não me engano, de apenas cin..co aninhos, conhece uma amiguinha que também brincava no parque naquele dia, na companhia da mãe.
- Como ela era vovô? – Perguntava a curiosa Líria.
- Era parecia... muito...; contigo, minha querida neta! – Confessava o avô.
- Me conte mais! Este menino chegou a brincar com ela?
- Sim, minha querida neta! A partir daquele momento eles se tornando grandes amigos! Ele apresentou a ela tudo que conhecia, e ela apresentou a ele, um momento de possibilidades.
- E que possibilidades foram essas, vovô? – Insistia a Líria.
- Líria, amanhã... te contarei mais sobre essa história, pois o seu avô agora está muito cansado. Tente dormir agora!
- Sì!
- Buona... notte!

E antes que a luz fosse apagada do quarto, a neta o chamava de novo:
- Vovô!
- O que foi?
- Me ensine a tocar piano?
- Um dia pequena minha, um dia! Agora durma, descanse da longa viagem que fizemos.
- Sim, vovô!
- Sonhe com os anjos, minha pequena!

A luz do quarto definitivamente se apaga, e o avô fecha a porta do quarto para que sua neta, enfim, conseguisse dormir. Então, a Líria dormia. Sonhava com os anjos, a lua e as estrelas, principalmente com a história contada pelo avô.


                                      FIM
                                             

(Carlos André)

Novela - O PIANISTA

Capítulo XLV – A segunda herança;

Não me esquecerei de lhes contar um dado superimportante na vida do nosso personagem.

Retornando um pouco na linha do tempo, no inverno de 1990, Alfred finalmente se casa com a Magda, que tanto gostara dele, e não sabemos ao certo, se ele gostava dela a ponto de se casar. O fato é que, Alfred herda deste matrimônio, três frutos a propagarem aqui na terra: a Valentina (a mais velha e idealista), Lorenzo (o do meio), que aos poucos se tornaria o filho mais ambicioso, e Eleonora (a filha caçula, e a mais musical).

Entre a primeira e a terceira linhagem, nasceriam os bons frutos, onde haveria o fruto bendito da esperança, do que poderíamos acreditar que a arte musical da família seria transmitida às gerações. “Alfred, venha, vamos descansar; está tarde!” Era Magda chamando-o, enquanto Alfred observava o piano coberto, que há tanto tempo não descobria e tocava, como em outras épocas.


(Carlos André)

Novela - O PIANISTA

Capítulo XLIV – O que realmente havia acontecido?

Estávamos em 2015, e Alfred custava a acreditar na morte de sua mãe e do seu pai, mortos há mais de oito anos.

 Leocádia morrera de insuficiência respiratória, devido a uma pneumonia que se agravou rapidamente em sua idade mais avançada. Quis o destino que Armênio morresse um ano antes do que Leocádia, acometido pela mesma doença traiçoeira tida por sua mãe, Lurdes Hermann. O tio Luigi morrera em um acidente automobilístico no ano de 2001. Milena, ainda estava viva, e já tinha um filho, herdeiro da família dos Alves Fellini, com vinte e nove de idade. Ambos moravam em Barcelona.

Os únicos, além de Alfred, que haviam até agora sobrevivido na velocidade do tempo, era a Margaret (com 45 anos), que era bailarina aposentada e consagrada, e Cyndi (com suas sofridas 68 primaveras), mãe de dois filhos homens (já crescidos na vida) e que a ajudavam a cuidar da loja de roupas, deixada por Madalena, desde sua morte. Giuseppe morreria sozinho, na primavera de 2004, depois da ex-esposa.


(Carlos André)

Novela - O PIANISTA

Capítulo XLIII – Espelhos no tempo!

Alfred não entendia o porquê que seu corpo naquele momento estava tão diferente depois que ele havia corrido na multidão.
- Experimente fazer isso, senhor! – Por fim, sentenciava a jovem do balcão, que bebia tranquilamente o seu café que acabara de chegar.
- Desculpe, garota! Eu já lhe disse...mas deixe! Não irei perder a pazienza contigo!

Alfred, resolvendo ir embora daquela biblioteca, resolve se olhar no espelho, que se encontrava no canto da prateleira, perto dos livros.

- Meu deus, como eu me modifiquei, tanto! - Essa foi a primeira reação de Alfred ao ver sua feição e todo o seu corpo refletido no espelho. Alfred até agora não percebia, que já se passara trinta anos desde o momento em que ele havia corrido lá fora, a procura daquela moça que se assemelhava com a Pérola. Se naquele tempo Alfred tinha vinte e um anos, agora ele estaria com cinquenta e um anos.


(Carlos André)

Novela - O PIANISTA

Capítulo XLII – É ela?!

- Ei, espere... você aí!!! – Grita Alfred ao avistar uma moça de costas entrando na mesma biblioteca que um dia Cyndi os levou, quando pequenos.

A moça, supostamente não escuta, portanto, nem chega a virar as costas. Será que esta jovem, era a mesma que passara bem perto de sua janela do ônibus? Era ela?

O coração aventureiro de Alfred não desisti, até agora nunca desistiu, e nunca havia perdido a esperança de encontrá-la. Vendo que a moça se direcionava até o balcão, e pedira um café bem quente, e o fato é que, ela não virava o rosto. De costas parecia muito com a Pérola, conforme as fotos que Alfred possuía.

Sendo assim, Alfred vai até o seu encontro, e grita:

- Pérola!!! – A moça rapidamente vira, com a exatidão da voz no espaço, e que todos ali presentes no espaço da biblioteca, haviam escutado o chamado “Pérola”.
- Desculpe, mas você se enganou, moço!
- Perdoe-me! Mas você se parece muito com uma namorada que há tanto tempo não vejo, tanto de rosto e de costa. Isso é incrível!
- Que pena que você ainda não a encontrou, senhor! – Lamentava simpaticamente a moça, que poderia ser uma irmã gêmea da Pérola, até no jeito de falar e sorrir.  
- Eu?! Senhor? Sou jovem ainda minha querida – Alfred desenhava um sorriso largo no rosto.
- Sim, todos nós somos jovens! Concordo contigo – E para concluíra, a moça dizia – Por via das dúvidas, sempre devemos acordar e nos olhar no espelho para vermos o que perdemos e ganhamos de fato do dia que se passou!
- Sim! – Alfred concordava sem exprimir nenhuma opinião relevante, quanto o que aquela moça o dissera.


(Carlos André)

Novela - O PIANISTA

Capítulo XLI – Coincidências;

- Tchau! –
- Até logo! Respondia Magda sem entender o gesto inusitado de Alfred.

Este já se encontrava longe do Palácio das Artes. Havia pegado o ônibus, não queria voltar de carro com os pais e a irmã, mesmo que esta merecia a presença do irmão no momento. Foi o único que ela não havia visto, depois da sua apresentação.

Alfred precisava refletir um pouco sobre a vida, e nada melhor do que retornar sozinho para casa, num ônibus com poucos passageiros.

Há um momento da reflexão, que ele tira da algibeira do terno listrado, a carta amassada pela raiva, pela indignação do ocorrido, onde Pérola escreve para que Alfred a venha visitar, pois ela está muito doente desde a morte da mãe, que morrera prematuramente de Aids, transmitida pelo padrasto, conforme informações vindas de Rodrigo. Se é que Alfred acreditava na inocência de Rodrigo, talvez sendo o grande responsável por impedir a Pérola de visitar a mãe, aqui no Brasil, quando Camila ainda estava viva!

Na carta não há nenhum indício de endereço. No ônibus, Alfred conduzia seu pensamento a uma suposta deturpação de endereços feita por Rodrigo, tornando-se o grande opositor da vinda de Pérola para o Brasil. Onde estaria Pérola, nesse tempo que se passou?

Da janela do ônibus, Alfred tem algum pressentimento de algum vulto, de alguma pessoa que passou perto de sua janela. Ao olhar para trás da janela do ônibus, que ainda está em movimento, Alfred se surpreende com a feição do rosto de uma jovem, aparentemente com vinte anos, e se assemelhava bastante com aquelas fotos mandadas por Pérola há algum tempo atrás, que Margaret retirou da gaveta a pedido do próprio Alfred. A moça agora atravessava a avenida. Alfred logo pede:

- Pare este ônibus, por favor! Quero descer.
- Desculpe, meu jovem pianista! Não podemos parar, pois estamos numa rotatória! – Coincidentemente, o cobrador do ônibus que admirava música clássica e conhecia a habilidade musical de Alfred, além do jornal do seu pai, advertia-o quanto a impossibilidade de o ônibus parar no momento.
- Mas eu necessito que pare! Pois meu destino pode ser definitivamente traçado nesse exato momento, caso vocês permitam que eu desça! – Concluía Alfred, decidido em não desistir de convencer o cobrador e o motorista. Primeiramente o primeiro, pois a decisão do segundo, resultaria na decisão do segundo.
- Você está bem, caro pianista? – Perguntava o cobrador.
- Sim, estou ótimo! Nada como uma boa caminhada para refrescar um dia intenso de apresentações no piano!
- Então, vou avisar o motorista para deixar você descer, ali, naquele ponto! Não ficará muito longe de onde você quis que parássemos.
- Grazie!

Logo que Alfred desceu, a velocidade amortecida em seus pés tornou-se seu grande aliado. Alfred corria em meio à multidão, na espera que encontrasse aquela moça, pela qual havia visto passando ao lado de sua janela.


(Carlos André)

Novela - O PIANISTA

Capítulo XL – O Cisne branco em meio à multidão!

Luz, câmera e ação!

Margaret entrava no palco. Era seu sonho, agora um sonho: realizável! Aquele palco era todo seu naquele instante. Ela dançaria com tantas bailarinas que admiravam: Irenia, Dária e Nina, entre tantas outras. Margaret estava representando o cisne branco.

 A você leitor ou leitora, que admire a arte do balé, deve está se imaginando os rodopios, as piruetas dos bailarinos, e a bailarina se jogando no ar e algum personagem do musical a salvando, mas por enquanto, deixem essas imagens guardadas no fundo da memória, e verifique de perto, sim! Levante e veja a luminosidade que havia nos olhos da Margaret.

Ela com seus sapatinhos prateados, invadia a imaginação do público com toda sua desenvoltura dançante em cima do palco; com um impecável “tendu”, “jeté” e no fim, uma “rond de jambé” que fez as palmas se antecederem, antes do término do musical.

Conquistar ou não? Deixar o cisne negro prevalecer na cena? Mudar de passo, e se entregar completamente na outra cena, lutando pelo o que é seu por direito?

Talvez seja isso que a Magda, que estava sentada lá atrás, pensava. Pois esta havia chegado atrasada na apresentação “O Lago dos Cisnes” da Margaret, e assim, não encontrara poltrona vaga na frente. Bem que Alfred a avisara que geralmente esses espetáculos, lotam logo na primeira venda de ingressos.

Armênio, ao lado, todo radiante não conseguiu se controlar vendo agora sua filha se apresentando no palco onde seu filho um dia brilhou. Armênio, já pensava de como descreveria para o editor, o título da manchete seguinte do Jornal Um novo Olhar: MARGARET, O CISNE BRANCO, EM MEIO A MULTIDÃO!     

- Eu não sabia que sua irmã dançava tão bem!
- Grazie Madga! – Agradecia como de costume em italiano o Alfred na saída do Palácio das Artes.
- Vamos marcar de sair algum dia desses?
- Sim Magda, vamos! Mas agora tenho que ir...


(Carlos André)

Novela - O PIANISTA

Capítulo XXXIX – Então, que o tempo desande a fazer sentido, no coração dos oprimidos: voz que liberta!
 
Já estávamos em 1985, ano da enfim DEMOCRATIZAÇÃO brasileira; fim de um período ditatorial armado com balas, cassetetes, paus de ararás, mortos, feridos, sangue de inocentes, cicatrizes ainda por cicatrizar (se é que se cicatrizariam com o tempo).

Alfred está com vinte e um anos, e é bastante reconhecido na região de Minas Gerais pelo seu talento como pianista, isso tudo a partir do grande desempenho pelo Concurso Musical em homenagem ao casal do classicismo romântico alemão, Clara Schumann e o seu esposo Robert Schumann promovido pela sua professora de piano, Julieta, no Palácio das Artes. Durante o ano 1985 foi o período que Pérola mais responde suas cartas. Ela está com vinte anos, e Margaret com dezesseis, prestes a fazer uma imperdível apresentação, também no Palácio das Artes, junto com algumas bailarinas vindas do Teatro Bolshoi.


(Carlos André)

Novela - O PIANISTA

Capítulo XXXVIII – É preciso que se dê tempo ao tempo!

- Va bene!! – Conformava-se Alfred – Esperemos então pra saber enfim do que essa conversa irá resultar!
- E a Pérola o respondeu?
- Ainda não! Mas ela me mandou fotos através de sua amiga. Está na gaveta, abre-a! Tem uma foto selecionada pra você.
Margaret abre a gaveta e encontra o embaralhado de fotos e cartas, entre as quais, uma carta a impressiona pelo formato e perfume diferente. Desde a partida de Pérola para Paris, talvez aquela fosse a primeira carta recebida por Alfred nos meses mais intensos da comunicação que se estabelecera entre ambos.
- Que carta cheirosa, Alfred! Essa aqui você nunca me mostrou que tinha recebido da Pérola! Ainda mais com um fio de cabelo dela em amostra!
- Eu mantive essa carta em segredo, até agora!
- Por quê?
- Eu não queria que ninguém o lesse, antes de ter certeza do que estava escrito era a pura verdade, relacionada aos nossos sentimentos.
- Posso ler?
- Agora pode!

“Meu querido e único amor que eu tenho e tive!

Hoje, minha menstruação desceu! A primeira de tantos ciclos, fases. A cada dia estou compreendendo o meu corpo, e suas exigências. Mas não é essa a grande novidade que eu tenho para lhe contar!
Tenho que lhe contar tantas coisas, e uma delas é o tempo.
Temo em não revê-lo mais, meu querido!
O que será do nosso tempo, será que teremos tempo, para amar de novo fisicamente, restabelecer o tempo que foi e estava sendo perdido?
Quero muito retornar ao Brasil, minha terra natal Belo Horizonte. Além disso, eu quero muito sentir o gosto do seu beijo doce e sereno de novo; eu quero me aventurar em seus braços, quero ter vários filhos contigo, e que eles tenham o mesmo talento que você.
Tenho poucos amigos aqui em Paris. Talvez o rio Sena tenha mais admiradores e turistas, do que eu em minha completa desarmonia com a vida. Eu te permito: pode rir de mim meu querido. Pra não dizer que eu não tenho sequer amigos verdadeiros aqui na França, contanto nos dedos, eu diria sete. Porém, nunca se igualará a nossa amizade construída desde criança.
Que os nossos filhos um dia leiam essa carta, e vejam o quanto seus pais se amaram, mesmo tendo a distância como principal vilã!”

 - Isso me tocou profundamente, caro fratello! E aquela ideia de você fazer excursão em Paris, está de pé ainda? Você pode revê-la! Os endereços estão na carta.
- Quase todos, Margaret! Na última carta, ela disse que mudaria de endereço, visto que Rodrigo, junto com a Pérola e a madrasta Patrícia mudaria de bairro, mas continuaria na capital. Quanto a excursão, não crie enormes expectativas. A Julieta, minha nova professora de piano, e que era assistente do eterno mastro Joaquim no Coral, tem novos planos para minha carreira de pianista para daqui há alguns anos – Joaquim havia se suicidado no mês passado, ao descobrir o verdadeiro motivo da morte do filho; fato este que abalou tanto Alfred, que o deixou de cama, embora no decorrer dos dias, ele tenha superado a partida do maestro, como se nada pudesse fazer para vencer a morte. 
- Saiba irmã – continuava Alfred - Julieta quer que quando eu entrar na faculdade e concluir o curso de Jornalismo, eu deva tentar carreira ou em Viena ou Alemanha como pianista.
- Que bom, caro irmão!
- Mas no momento eu não me agrado tanto da ideia. Primeiro, eu tenho que resolver minha situação com a Pérola, para depois pensar em despontar de uma vez minha carreira como pianista pelo mundo afora.
- Sim, e eu te ajudarei no que for preciso!

Margaret confortava o irmão. Abraçava-o afetuosamente, como muitas vezes ele fizera com ela, confortando-a em seus momentos de infelicidade passageira. Entretanto, a de Alfred não parecia, até o momento, ser tão passageira assim.

Na sala, tendo Cyndi que agora estava transformada, tanto fisicamente (pois a parte castanha do cabelo estava pintada de preto, e a outra parte ainda ruiva, mantinha o formato original desde quando a apresentei a vocês) e psicologicamente amadurecida com os baques da vida, havia chegado a um ponto final daquela discussão. Com a aprovação de Cyndi, Leocádia decidiu que o melhor caminho até o momento, é Giuseppe passar um tempo na Itália, até a dita poeira do delito do adultério se abaixar de uma vez por todas. Mesmo que Luíza não fosse tão santa, e também não fosse tão vítima assim, Leocádia a despede pagando o seu adiantamento.


(Carlos André)

Novela - O PIANISTA

Capítulo XXXVII - Margaret vai até o quarto de Alfred trazer a notícia;

Ao invés de ir para seu quarto, Margaret vai até o quarto de Alfred trazer a notícia da chegada inesperada do tio.

Alfred, concentrado em seu piano, dando os retoques finais na composição de “II ritorno di un grande amore”, pergunta logo ao avistar a visita de sua irmã em seu quarto:
- O que foi Margaret?
- Alfred, adivinhe quem chegou e está plantado na sala!
- Não me diga que Pérola retornou! – Alfred a respondia com a cândida inocência, não tanto perdida assim.
- Não!! Você passou muito longe, Alfred!
- Magda?!
- Quem é a Magda?
- Uma colega de aula.
- Eu não a conheço, mas não é esta tal de Madga que você diz! Eu disse “plantado”, ou seja, é alguém no masculino.
- O professor Pietro?
- Não.
- O flautista Giovanni, amigo do nostro padre!
- Também não!
- O violinista Armando, para saber de como está à preparação para o concerto do final de semana?
- Não, e não! Armando não viria em casa sem a Miriam. Se esqueceu que ambos não se desgrudam um do outro?
- Por favor, Margaret! Diga-me logo, estou ansioso!
- Uma pista?
- Sim, pode ser!
- Ele te deu de presente, no natal do ano passado, um disco que continha o Capriccio completo de Niccolò Paganini, e outro disco da Ópera de Bizet interpretada por Maria Callas, talvez seja o mesmo disco que nostro padre te deu de presente sem saber que...
- O tio Giuseppe daria! Só pode ser ele! – Alfred exclamava todo contente levantando-se do piano e indo em direção a porta, quando rapidamente Margaret o adverte:
- Fique onde você está, Alfred! A mãe não quer que nem eu e você estejamos na sala agora, pois eles estão conversando, um assunto, que pelo visto, é de extrema importância.
- E qual é o assunto que eles tanto conversam que não podemos ouvir?
- Eu não sei exatamente, mas acredito que esteja ligado com a tia Madalena, como sempre esteve!


(Carlos André)

Novela - O PIANISTA

Capítulo XXXVI – Leocádia se encontra indignada!

- Por que você fez isso Giuseppe?!
- Irmã, eu não sei exatamente o porquê, mas sei que fiz com toda a racionalidade de um homem que ama.
- Por mais que eu e a Madalena, não nos damos tanto certo, ela não merecia passar por isso.
- Mas minha querida irmã, eu não pensei tanto em não fazer; digo de aceitar a sedução de Luíza, o seu olhar tentador. Várias vezes esse olhar me perseguia quando eu vinha para cá. Eu me permitia sentir mais um pouco daquilo que me foi roubado faz tanto tempo: a paixão, se apaixonar outra vez!
- Caro fratello, eu não repreendo que você se apaixone por outra, mas que pelo menos se apaixone já separado de sua esposa, sem que esse anel de compromisso, esteja ainda enfeitado em seu dedo!
- Sì cara sorella! Assumo toda a culpa. De fato, eu escolhi a Luíza, pois meu coração não sabia há tanto tempo o que era sentir desejo e atração carnal por outra mulher.
- Afinal de contas, se você era infeliz há tanto tempo, por que você não se separou da Madalena?
- Talvez para não atrapalhar a boa relação que voltava a se estabelecer entre Cyndi e Madalena.
- Giuseppe, Giuseppe, não seja tosco de argumentos em minha frente! A nostra madre e o nostro padre, que Deus os tenha, nunca lhe perdoaria por este feito.
- Irmã, te peço: me perdoe! Eu ajoelho em seus pés!
- Deixe de teatro Giuseppe! Levante-se! Comporte-se. Você como irmão mais velho, deveria dar o exemplo.
 - Você sabe muito bem que a minha relação com Madalena nos últimos tempos ia se desmoronando pelas beiradas. Cyndi, um dia até me disse se surpreendendo de como o nosso casamento se sobrevivia, Madalena indisposta de sair, atarefada em suas costuras, e eu disposto de corpo e alma a vir para Belo Horizonte, sair do tumulto daquela empresa onde eu trabalhava, refrescar a mente, estabelecer a saúde.
- Tio?! – Era a Margaret que acabava de chegar da aula de balé, e se surpreendia com visita inesperada do seu tio.
- Margaret, minha querida bailarina! Olhe como você cresceu! Como vai a escola e as aulas de balé?
- Vão bem, no melhor do possível, tio!
- Margaret, eu e seu tio estamos conversando. Por favor filha, vá pra seu quarto se trocar.
- Está bem, madre!


(Carlos André)

Novela - O PIANISTA

 Capítulo XXXV – Acalmemos: caros leitores e leitoras!

Para esfriar e acalmar um pouco a tensão das últimas cenas, retornarei nas cartas de Alfred endereçadas a sua amada distante. Certa tarde, não muito distante da última, depois da revisão sobre a Ópera La Bohéme de Puccini com o maestro Joaquim, Alfred, sentado em sua escrivaninha, escreve para Pérola:

“Pérola, amore mio!
Não vejo a hora de lhe encontrar! Eu soube da notícia por uma amiga sua, que chegou a pouco tempo de Paris, que você viria no final do ano junto de sua mãe.
Amore me diga que isso é verdade. Que eu não ficarei eternamente te esperando. Estou compondo uma peça em sua homenagem. Você que tanto gosta que eu toque composições que iniciem com as notas agudas, utilizarei essa técnica desta vez, especialmente para ti. A composição se chamará (O Retorno de um Grande Amor), e fará com que você se lembre daquela noite que estivemos juntos, abraçados, admirando as estrelas, e perguntando-nos: para onde vão os astros quando partem as estrelas?”


(Carlos André)

Novela - O PIANISTA

Capítulo XXXIV - O Desfecho do Adultério;

- Que sem-vergonhice é essa em cima da minha cama!!! – Gritava em fúria e a plenos pulmões a Madalena. Luíza, estando completamente nua e suada, logo pula da cama e tampa o rosto. Tenta, pelo menos!
- Querida, espere... – gaguejava o coitado do tal Giuseppe, que não encontrava palavras exatas para justificar a traição, aquele adultério! – Acalme querida, que eu posso te explicar!   
- Que querida o quê Giuseppe! Explicar?!!! Não será preciso, está aí sua explicação, todinha em pé. Sua empregadinha duma figa! Não, melhor dizendo, uma puta da esquina... pensa que eu não posso lhe reconhecer?!! Sai de Belo Horizonte para vim até Guanabara, até o nosso apartamento... e você, Giuseppe, é o maior culpado por deixar se seduzir por essa daí – Madalena logo correu em direção a Luíza, e desferiu um tapa daqueles de doer e deixar marca por uma semana no rosto da Luíza.
- Não faça isso, pelo amor de Deus!! – Gritava Giuseppe.
- Eu te mato, sua imprestável!! – Berrava Madalena, abrindo as duas mãos que se tremiam e agarrando com os punhos fechados - e com toda vivacidade - os cabelos da empregada Luíza, puxava e arrancava grandes mechas do seu couro cabeludo. “Ai, ai, ai, pare, por favor! Desculpe... me perdoe!” Sim, exatamente ela: Luíza, a empregada de longa data, da casa da família dos Alves Botticelli Fellini, que se encontrava ajoelhada e gritava de dor, enquanto Madalena puxava o cabelo e batia em seu rosto.
- Desculpas?! Agora eu não quero ouvir desculpas e nunca te perdoarei. Isso não se faz sua sem-vergonha, além do mais, com homem casado, pai de família.
- Mas... eu não tenho culpa...ai, ai! Seu marido que me escolheu... ai, pare, chega disso Dona Madalena!
- Olhe ela, querendo se safar! Mas pense que eu sou boba?! Que eu não sou esperta?! Não me diga que você aprendeu isso na escola de bons modos! - Satirizava Madalena, e continuava puxando com toda força os cabelos da Luíza, e por último cuspia em sua cara, fazendo o catarro amargo de indignação escorrer em sua face branca e avermelhada.

Nesse vai e vem do diálogo, dar tempo de Giuseppe colocar a cueca e vestir a calça. Giuseppe retira Madalena de cima de Luíza. Esta chora de tanta dor. Há um laivo de sangue em seu braço esquerdo, arranhado pelas unhas afiadas de Madalena. Luíza deixa o quarto (lembre-se leitor, que ela ainda está nua) e corre até o banheiro.

Enquanto isso, Madalena que ainda não exprimiu nenhuma lágrima significativa de frente para seu marido (ou ex-marido) traidor, resolve dar uma bofetada na face direita dele. Giuseppe não se revida. Nunca se passara em sua mente retribuir aquele tapa, daquela manhã longe de ser esquecida.

Giuseppe estava calmo e sereno.

Às vezes Giuseppe pensava: “Isso não era pra ter acontecido!” ou “Eu deixei me envolver pelas tentações da carne!” Nenhuma das duas sentenças do seu pensando iam de acordo do que estava por vir.

- Giuseppe! Quero que você pegue suas coisas e caia o fora daqui! – Disparava Madalena já decidida no que iria fazer.
- Madalena, te lo chiedo... vamos conversar! – Era pouco de se entender o motivo que Giuseppe utilizava o “eu te peço” em italiano, já que em nenhum momento da cena de adultério, ele exalta sua descendência.
- Não venha com lamúrias pra cima de mim, Giuseppe! Eu te conheço faz tanto tempo, e um deslize como este de tamanha proporção, quebra o clima de qualquer relação que foi sustentada por muitos anos, feito a nossa!
- Dar tempo de reparar os danos cometidos! Perdoa-me!
- Não! Por favor, vista e dê o fora daqui! Vá... vai correndo pra casa de sua irmãzinha Leocádia, quem sabe ela possa te ajudar! Não se esqueça de levar sua amante que está lá no banheiro, chorando. Hoje mesmo sua filha saberá de sua façanha.

Assim sendo, Giuseppe coloca rapidamente algumas roupas na maleta. Pega o vestido florido da cama, enrolado na calcinha molhada da Luíza, enquanto esta lava seus braços na pia do banheiro.

- Luíza, se vista! Chamarei o táxi pra você! – Giuseppe entrega o vestido e a calcinha.
- E pra onde você vai?
- Eu não sei ainda!
- Eu não quero ficar só! – Desesperava em prantos a Luíza.
- Acalme-se! – Giuseppe tentava conter a situação – Pedirei o taxista para te deixar no aeroporto próximo daqui! Trate de pegar o avião e ir direto para sua casa em Belo Horizonte. Tudo bem?
- Sim, tudo bem! Farei o que você me pede.


(Carlos André)         

Novela - O PIANISTA

Capítulo XXXIII – O escândalo, com o perfume do sândalo que brotou da terra;
     
- Espero que dê certo meu querido irmão! Até já me conformei com a não ida a Moscou!
- Caso não seja agora, você terá outras oportunidades de ir querida irmã!

Um “toc, toc” se ouvia da porta. Era Leocádia chamando-os para irem almoçar.
- Já estamos indo mamma! – Do quarto, Alfred respondia – Vamos lá almoçar Margaret!
- Não estou com tanta fome! – Respondia a Margaret, convincente de seus ideais aos dez anos de idade. Notem que a diferença de idade entre ambos eram de seis anos.
- Anime-se!! Não é você que me disse que já tinha se conformado?
- Va bene, va bene, va bene... – Margaret, rapidamente se levantava da cama, abria a porta e se direcionava para a cozinha.
- Nostra!! – Exclamava Alfred para as paredes.

Na cozinha, vendo a filha mais conformada com o assunto “Moscou”, Leocádia, aproximando-se de Margaret, exclamava:
- Vem cá, minha querida! A mãe te ama tanto, e sempre quer o seu bem! Quando você estiver um pouco maior com certeza entenderás, se é que já não entende!

Leocádia acariciava os longos cabelos castanhos de Margaret que herdara de sua genética, além da pele clara; os lábios, olhos, e nariz, tem inteira característica genética de Armênio. Alfred só herdara os olhos de Leocádia, os lábios delgados, o nariz e o feitio dos pés. Agora, a pele morena (semelhante ao romantismo dos matizes da “Grande Figura Nua Deitada” de Modigliani, que se encontrava exposto na parede do Jornal Um Novo Olhar, e a pintura “A Última Ceia” de Leonardo da Vinci que se encontrava na sala), fora herdada de Armênio, além do cabelo um tanto macio. Sem contar que Alfred, agora deixava um pouco sua barba crescer, mesmo que gostasse sempre de mantê-la baixa, mas utilizava deste estilo para encarar grandes decisões – eu diria grandes concertos de piano que estavam por vir -.
- Dona Leocádia, hoje eu tenho que sair um pouco mais cedo, aquilo que eu tinha lhe falado: a minha amiga Gabriela está se recuperando de um câncer de mamas. Eu até arrumei a casa antes do horário previsto – Dizia Luíza justificando a saída mais cedo.
- Eu até estranhei a Gabriela não ter mais vindo lhe ajudar na faxina do apartamento. Ela é tão competente no que faz! – Elogiava Leocádia no momento de infortúnio da Gabriela.
- Compartilho da mesma opinião sua dona Leocádia!
- Tome! Vou lhe dar este dinheiro para você passar na floricultura e comprar um buquê de margaridas para a Gabriela. Diga que as margaridas são em nome da família Alves Botticelli Fellini, que a deseja uma ótima recuperação!
- Obrigada pela gentileza Dona Leocádia! Farei isso agora mesmo. Até amanhã! – Ansiosa, se apressava Luíza.
- Por nada Luíza! Não queres almoçar conosco antes de ir?
- Não, dona Leocádia! Eu agradeço, mas desta vez não. Estou com muita pressa...
- Sì! Até amanhã.
- Tchau Margaret!
- Ciao Luisa!

Bem provável que Luíza passasse na floricultura logo que saísse do apartamento, todavia, antes disso e de passar na casa da Gabriela, ela foi resolver algum assunto pendente com o taxista que a estava esperando.
Na casa da família de Cyndi, em Guanabara, tudo ocorria bem. Madalena estava com a clientela cheia: várias encomendas para costura. Giuseppe estava desempregado. Cyndi havia arrumado emprego na parte da manhã no consultório odontológico do casal Lucélia e Fernando, que haviam mudado para a Guanabara e transferido o consultório, mesmo ainda tendo uma filial em Belo Horizonte, no sentido Lagoa da Pampulha. Além do emprego, Cyndi conseguiu dar uma entrada no apartamento da Vila Horizonte, hoje Bairro Pompeia em Belo Horizonte, e faltava a última prestação do mês para ser paga: enfim, declarar o retorno às terras mineiras.

“Ding dong”, é a campainha do apartamento a tocar, exatamente às oito horas no “prego”. Às nove horas da manhã, Madalena chega cansada da Loja e percebe a porta entreaberta, e exclama: “Que estranho!”. Madalena se dirige a passos lentos para o seu quarto, pois prevê que algum ladrão tenha entrado no apartamento. Ao abrir a porta do quarto, Madalena, utilizarei uma linguagem da botânica apropriada para o momento, se depara com Giuseppe “trepando” com Luíza, que estava com perfume de sândalo esparramado por todo corpo, rebolava e gemia feito uma loba, por cima do pênis do quarentão Giuseppe.


(Carlos André)

Novela - O PIANISTA

Capítulo XXXII – Os desmembramentos;

- Margaret, calmati!  – Dizia Alfred, carinhosamente abraçando-a, se prontificando a ajudá-la.
- Alfred, eu não entendo por que eles não deixam? – Margaret se indignava.
- Você sabe que o nostro padre e a nostra madre lhe querem sempre o bem. Eles são preocupadíssimos que algo dê de errado nesta sua viagem, se compararmos com o momento atual que a Rússia está vivendo. Eu também preocupo muito contigo, embora eles tenham exagerado em pelo menos não conversar com a Valéria a respeito de como será de fato a excursão da Companhia de Balé do Compasso e Virtude. Eu gosto muito de vê-la dançar, saiba disso. Logo, quando eu ficar mais de folga da peça do maestro Joaquim, irei compor no piano para que você dance... mas Margaret, pense nisso que estou lhe dizendo, por mais que o padre e a madre estejam totalmente equivocados nesse quesito.
- Sì, meu caro irmão! Às vezes me pergunto: por que é mais fácil para você do que eu? – Questionava Margaret na procura de algum caminho concreto.
- Não é isso Margaret! Pelo menos eu não vejo assim, do jeito que você vê. Talvez eles te protejam mais por você ser a única filha “mulher”, a caçula da família. O incrível é que, o piano e o balé, são artes que se combinam. Em ambos, você exercita quase todas as articulações. No balé usa-se mais os pés, ao contrário do piano que usam mais as mãos.
- E suas mãos estão melhorando?
- Sì! Consultei o Dr. Arquimedes! – o Dr. Arquimedes era o médico da família (especialista em mãos, e nas horas vagas, psicanalista) - Ele me disse que a causa dessas dores nas articulações das mãos, resulta-se dos movimentos repetitivos. O nível de gravidade irá depender do grau de atuação do musicista em sua área. No caso da minha, o piano, o radiograma das minhas mãos deram perfeitas quanto ao conjunto ósseo. O inchaço na ponta dos dedos e a vermelhidão, conforme o que ele disse, é início de reumatismo. Durante um mês tomei o remédio para cortar a progressão   Mas estou muito melhor do que algumas semanas anteriores. Você viu como eu me queixava das insuportáveis. 
- Sì, fratello mio! – Margaret abraçava-o – Grazie per avermi aiutato!
- Per niente, mia sorella! Hoje eu recebi a segunda carta da Pérola! – Exaltava Alfred no final da sentença.
- Que Por favor, leia para mim!
- Sí! – Alfred retirava a carta do bolso dianteiro da calça, e lia.

“Meu querido Alfred!

Aqui as coisas vão bem. Infelizmente está sendo difícil me acostumar com a turma. São somente seis brasileiros numa turma de vinte franceses, e eu sou a única menina da turma. Estou me esforçando muito na matéria referente à língua francesa, pois quero muito aprender este idioma.

Meu coração está tão partido sem saber respostas suas. Sei que fizemos um trato de mandar cartas pelo menos duas semanas de cada mês, mas até o mês de fevereiro, todos os carteiros que fazem entregas no meu bairro, estão em greve pela melhoria das condições de trabalho e renumeração. Lembra quando estudávamos sobre a Revolução Francesa? Pois então, este acontecimento me fez lembrar quando você proclamava “Liberté, égalité, fraternitéI”, e isso dizia tudo sobre a busca dos nossos direitos. Agora entendo o porquê da greve dos carteiros. Tomara que em fevereiro eles retornem, pois não aguento mais esperar um dia para responder suas cartas. Escreverei mais do que duas, para compensar o atraso. E para não perder a tradição, escreverei em italiano essa simples declaração:
Ti amo tanto mio caro! Já quero está contigo para sempre.
Della tua ragazza e querida Pérola!
Beijos para a Margaret e família.

Obs: na próxima carta me fale de como está a Cyndi!
Até, mio amore!!

31/10/1980.”

- Alfred, eu tenho tantas saudades da Pérola! Na próxima carta escreva dizendo que eu quero que ela venha logo.
- É o que mais peço a Pérola, Margaret!! Esperava que ela viesse no natal, mas Camila irá visitá-la. Até pensei em pedir o nostro padre e a madre para que deixasse que eu fosse com a Camila para Paris. Além do mais, daqui dois anos, estarei completando dezoito anos, e Pérola completará em março de 82, dezessete. 
- Peça ajuda ao professor Joaquim! Quem sabe ele não inventa uma excursão de apresentação... de algum concerto para piano do Claude Debussy... ou Georges Bizet... Maurice Ravel...
- Não se exalte tanto, Margaret!! Faltou Guillaume de Machaut na lista – Alfred, com seu bom humor, sorria para Margaret, e continuava - As excursões nesse período que se aproxima do natal são escassas. A maioria dos maestros não enfrenta uma excursão nesse período, para estarem junto de suas famílias para o natal e réveillon. Aguardemos...


(Carlos André)

Novela - O PIANISTA

Capítulo XXXI – O descobrimento dos dois mundos;

- Alfred, nos presentei com a leitura de sua redação a respeito do descobrimento do Brasil! – Convidava o professor Pietro (amigo comum da família) para que Alfred viesse na frente e lesse sua redação para que seus colegas ouvissem.
- Va bene professore Pietro! – Alfred, antes de se levantar, olhava nas linhas das duas palmas de sua mão: a direita com o formato de um K, e a esquerda com o formato de um M (ele começou a ter essa mania, desde quando Pérola lhe enviou a primeira carta de Paris), e atendendo ao pedido da leitura, ele lia a redação:

“Na verdade, se analisarmos os viés da questão, aquilo não foi exatamente um descobrimento, e sim...” a Magda, que sentava na mesma fileira e numa carteira atrás da de Alfred, se entusiasmava, vertia nos gestos e no olhar, um agrado do estilo inovador da escrita de Alfred.

Magda, desde a partida de Pérola para Paris, foi a que mais se aproximou de Alfred na turma do Primeiro Ano “A”. Na turma (que saíram alguns e entraram outros desde a sexta série), quase todos simpatizavam pelo talento extraordinário de Alfred, exceto, o Matteo Vitale, que era esguio, e o Isac Salvatore de feição carrancuda e corpulenta (ambos tinham uma linhagem italiana naquela turma), que não chegavam a confessar, mas por dentro acreditavam e torciam veemente para que Alfred fosse um fracasso na carreira de pianista.

- Grazie, mio caro! Gostei desta sua articulação diante de um texto crítico-reflexivo que você escreveu. Agora, pode se assentar! – Elogiava o professor Pietro ao jovem Alfred e logo emendava – Convido para vim aqui na frente o Isac Salvatore!
- Eu não professor! – Se negava a ir um daqueles que detestava o Alfred.
- Por que não Salvatore? – Inquiria o professor Pietro.
- Por que não!
- Eu te pedi uma resposta que justifica a sentença, e não uma negativa!
- Meu texto é uma negação, professor! – Salvatore, que fedia chulé nos sapatos, tentava se justificar, mas não conseguia de jeito algum convencer o professor Pietro.
- Para isso, precisamos ouvir sua redação, pois só assim veremos se é ou não é uma negação como você diz – Utilizava-se da boa oratória o professor de redação e literatura.
- Mas é que...
- É o que?!
- Professor, eu...
- Diga a verdade Isac Salvatore!
- Eu não fiz a redação: é isso e pronto! – Todos na sala nesse momento, soltaram uma gargalhada que se ouvia na sala nove, no corredor e até no pátio. Seus colegas talvez não soubessem dos motivos que o fazia ser assim. Analisemos: Isac Salvatore quase sempre acordava em cima da hora, chegava atrasado aos seus compromissos; lavava o uniforme uma vez no mês (e olhe lá!); quando se estressava e a mãe ou o pai o perguntava o porquê, ele respondia-os com nomes horrendos, sem contar que tentava seduzir a Marieta (que sentava lá atrás) que não dava a mínima atenção para ele.
- Então, Isac Salvatore! O único jeito será te conceituar com um zero de descomprometimento do exercício.
- Não, professor!!!!
- Tenho que fazer isso Salvatore! Senão, eu descumpro a minha regra número 1: não fugir fora dos meus padrões pedagógicos. Vamos vê se na próxima vez, você não vá falhar nas atividades extraclasses.
- Eu prometo que não falharei, mas me salve pelo menos desta atividade!
- Non posso e non dovrei! Non ti preoccupare caro studente, seu nome já tem um significado de que em algum momento, você irá se salvar...salvare. Credo, forse!
- Perdonami, prego...
- Non, Salvatore! Da próxima vez, tragam os exercícios que lhe peço! Agora, que venha aqui na frente o Matteo!
- Eu também não fiz professor!
- Este também é outro buon Dio! Não sei onde vocês irão chegar.
- Eu sei: seremos melhores do que você Pietro! – Disparava Isac Salvatore, sem ao menos avaliar o peso do que dissera.
- Sì, Salvatore! Eu espero que seja, embora vocês tenham que melhorar em muitas coisas, e uma delas é a: humildade e a honestidade. Palavras primas, mas que se difere em suas ações. Meninos, viremos a página. Agora, querida Madga, nos brindem com la sua scrittura!
- Sim, professor Pietro! – Dizia Magda levantando da carteira, e se direcionando na frente. Magda lia:

“Antes de tudo, nós brasileiros, devemo-nos descobrir quem realmente somos a cada dia que olhamos no espelho...”; Magda, que no fim da leitura, se contentara com a reação da turma e do professor Pietro, olhava diretamente para Alfred, como se quisesse consiga mesma: “Alfred, grazie pelas aulas de redação”. Ambos se ajudavam na hora do recreio: Magda ensinava para Alfred alguns conceitos de química, física e trigonometria, e Alfred ajudava-a nas matérias de português, literatura e redação.

Naquele dia, quando Alfred chegou na sua casa, Margaret, que estava tão ansiosa em dar a notícia para a família, abraçava o irmão logo quando o viu entrar, e dizia:
- Alfred, eu tenho una notizie extraordinária!
- Qual é a notícia?! Não me esconda nada Margaret. Conte-me tudo!
- Espere o nostro padre e mostra madre chegarem, que eu contarei a todos. Você também Luíza! – Margaret convidava com olhar carismático para que Luíza deixassem os afazeres no momento, e se juntassem a eles.
- Nos conte Margaret! Eu ainda tenho que terminar de passar pano nos quartos, e depois terminar de estudar a matéria que cairá na prova de hoje! 
- Não se preocupe Lú! Dará tempo você passar pano e estudar. Se você quiser eu te ajudo na arrumação dos quartos. Minha mãe non se importará. Eles já estão chegando, vamos esperar – Dito e feito! Margaret foi terminando de falar, dito e feito: Leocádia e Armênio chegam, vindos do Jornal Um novo Olhar, que antes era Jornal O Novo Olhar, porém, com o acréscimo do artigo indefinido “um”, tornou-se Um novo Olhar.
- O que foi que aconteceu?! Por que a cara de espera? – Analisava Armênio.
- Pai, eu tenho una notizia straordinaria para contar a “vocês”!!
- Poi nos conte figlia mia! – Leocádia solicitava-a.
- Eu fui uma das aprovadas para dançar o Lago dos Cisnes! – Margaret, que com a pele esbranquiçada ruborizava ao dar a notícia, despejando os pormenores da notícia em cada canto da sala – Só que para isso, eu terei que fazer uma excursão de um mês em Moscou!
- Por que em Moscou, e por que um mês de excursão? – Inquiria Leocádia, assustada com a notícia, sem se ater na verdadeira relação que havia entre Moscou e a arte do balé.
- É porque lá se encontra a melhor escola de balé do mundo, e nossa professora Valéria conseguiu essa excursão pra nossa Companhia! E um mês seria o necessário para que estudássemos as variações dos passos que ocorrem no original. Prego, eu quero tanto ir. Além do mais, é com tudo pago. Minhas amigas estão contando que eu vá. Os pais delas deixaram.  
- Figlia mia! No momento, a Rússia está numa situação política e diplomática muito difícil para se lidar – Armênio tentava diminuir ou apagar o fogo de entusiasmo da filha.
- Ma papà!! – Implorava Margaret.
- Figlia, prego! Não nos peça isso. Eu nem sei como eu ficaria aqui, sem saber notícias suas de imediato, do outro lado do continente – Leocádia proferia colocando uma das mãos na testa.
- Va bene!! Grazie per la comprensione! – Margaret ironizava a decisão tida pelos pais, e cabisbaixa, saía da sala indo em direção ao quarto. Margaret não chegou a chorar na frente deles, no entanto, abraçado no cobertor, pois o início da tarde belo-horizontina, na parte pacata do bairro de Santa Tereza estava fria... e algumas lágrimas tímidas ensaiavam em descer do seu rosto gracioso. Podemos comparar esta cena, com o descanso das asas de um anjo, que também pudesse se encontrar triste em seu recanto, amargurado pela decisão tomada por seus superiores. Margaret ainda não compreendia a dimensão da preocupação maternal e paternal que havia ali.
- Alfred, vá lá acalmar sua irmã! – Leocádia pede.
- Sì, madre! – Alfred, depositando a mochila no sofá, partia em direção ao quarto da Margaret. Percebendo que Margaret havia trancado a porta, ele pede – Margaret, ti prego, per favore apri la porta! – Escutando a voz do irmão, Margaret, se descobrindo, levanta da cama e antes de abrir a porta, indaga:
- É só você que está aí?
- Sì, solo io!

Assim, Margaret deixa o irmão entrar no quarto, como se o quarto fosse o símbolo, de conseguir a chave para entrar no coração, e definitivamente compreendê-lo no seu descobrir!


(Carlos André)