segunda-feira, 24 de julho de 2017

Conto - Hortência

Hortência

Mulher determinada esta Hortência. Quase sempre não se desvanecia. Hortência era menina, menina mulher. Uma jovem na verdade, com suas vinte e oito primaveras. Uma jovem com tendência a ser adulta.

Todos os dias – ou quase todos os dias – Hortência lia debruçada sobre a relva. Nos intervalos, fazia daquilo tudo um piquenique: mordia o pedaço da maçã, que não era dos livros, mas da realidade, como se saltasse para fora dos livros. Saboreava uma parte do melão com gosto de jabuticaba, e relembrava de tua infância.

Quando criança adorava sonhar de braços abertos na relva.  Pensava nas possibilidades que existiam de afinidade, entre ela, e o autor daquele livro.

Hortência - sempre, ou quase sempre – ia ao cinema e chamava sua amiga Natty.  Natty era diferente de Hortência, pois Natty não era aventureira nas palavras, nos livros de cabeceira. Natty era aventureira nos gestos, no olhar, era muitas vezes objetiva do que a intensa subjetividade de Hortência, que era aquela mulher voltada para a sua criativa imaginação.

Ao contrário de Natty, Hortência sofria com certos desencantos da vida. Um exemplo: Hortência mal enamorava nos primeiros dias, que no último dia da semana, idealizava que este seria teu futuro marido. No final, Hortência descobriu que ele tinha outra no coração. Vai saber o que passava no coração de Hortência. Têm vezes que o coração começa a pensar mais do que a mente. Deixemos de lado esta história e vamos para outra.

Certo dia, Hortência foi convidada para a festa de aniversário de sua amiga Mary, que diferente de Natty, era aventureira em esbanjar vaidades. O que falar da cama repleta de presentes quando ela chamou Hortência e Natty para ajudá-la a desembrulhar.

Só foi pisar o pé no limiar da porta, que Mary se voltou para Hortência e Natty, e proferiu em êxtase:

- Vejam só...quantos presentes eu ganhei!!!! Isso não é uma maravilha? Todos esses presentes demonstram que sou uma mulher prendada, e muito popular, principalmente com os garotos.

Hortência estava quase explodindo de raiva, não diria inveja amarga, pois ela pouco sentia. Estava quase a dizer para Mary: “Amiga, melhor você jogar teu excesso de vaidade pela janela, e trazer de volta e em abundância, tua humildade”, mas Hortência se conteve, e bem lograva em retornar para casa, voltando tua atenção para o livro que tinha começado a ler.

A Natty? Não sei o que pensava no momento. Ambas, tanto a Hortência e Natty se contentavam em dizer: “Que lindo amiga!”. Porém, pelos gestos, suponho que Natty olhasse de esguelha, com desprezo para aquela atitude mesquinha da Mary.

O aniversário chegou ao fim. Todas as luzes do apartamento se apagaram, pois era de descanso. Hortência retornou para a casa sem revelar o que passou pela tua mente no momento dos presentes espalhados na cama e atitude pouco.

Ao amanhecer, quando o sol tangeu as montanhas e os picos gelados, e saldara também os ímpios, estava lá Hortência, debruçada sobre a relva, lendo teu outro livro, mantendo uma relação íntima com o autor daquela história diferente daquele, de outro dia. Se procurar e não encontrá-la, pouco importa caro leitor arguto.  Hortência muitas vezes podia está dentro do livro, e no momento em que poucos esperavam, Hortência podia saltar do livro para a realidade, como agora!

(Carlos André)

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