Crônica Moderna
Inevitável! Todas as nossas
probabilidades são inevitáveis. Certa vez, dizia o senhor Linius:
-Tua vida ainda terá
surpresas!!!
-Quais hão de serem essas
surpresas?
-Não sei. Tu a de
retornar?
-Hei de pensar no
assunto.
Confesso ao leitor que inevitavelmente
a de notar na crônica suas devidas tensões de enredo; cartas espalhadas em cima
da mesa; o toalete e seus batons. Tua boca misteriosa que dita à iminência da
crônica moderna. Sei! Que ela deixara a porta do apartamento escancarado, marcas de saudades frias e entediadas no cobertor.
-Por que não disse a ela?
-Dizer o quê?
-Você sabe o quê.
-Talvez não adiantasse.
-Adiantaria sim! Não
espere que o mundo fale por você.
-Por que diz isso? O
senhor sabe que eu não devo retornar.
-Não! Tu não sabes de
quase nada, doutor Friedrich.
-E o que eu devo saber de
tão importante senhor Linius? Diga-me.
-Quero que retornes. Não
é um pedido que lhe peço. São seus inevitáveis que pedem a ti que retorne.
-Não lhe compreendo
senhor Linius!
-Tu me compreenderás
quando fores retornar.
Esta não é uma história fictícia. É uma
história de inevitáveis. Se o leitor não me compreende de imediato, o perdoarei
por não me compreender de imediato. Porque não compreendi de imediato os
inevitáveis, e nem o motivo do retorno ao apartamento. O senhor Linius foi meu
professor de literatura no Liceu. Agora tinha compreendido de ele ter uma
literatura imediata: “são os inevitáveis da vida” – dizia ele.
Tive que ir de ônibus para chegar ao
apartamento. Três ônibus de imediato. “Lembre-se meu jovem, são os inevitáveis
que a vida nos reserva”, relembrava os dizeres do professor Linius. Até aqui,
poderia eu entender o que seria os “inevitáveis da vida”. Um pensamento em vão,
esquecido no ponto de ônibus, de fato, aqueles três ônibus que peguei, não
seriam inevitáveis, visto que, de imediato, eu poderia ter ido de metrô ou
táxi. “O inevitável é aquilo que nos consola”, repetiria esta frase no primeiro
ônibus, pensaria que o professor Linius estivesse ambíguo ao dizer à frase que
eu repetiria em algumas ocasiões da vida.
Veja que no primeiro ônibus percebi que
do meu lado, havia uma mulher que amamentava teu bebê que a pouco chorava, e
isso, nos consola, e consola o bebê ainda mais; bebê que sugava levemente o
leite quente materno – êxtase nas glândulas mamárias. E isso, consolava a mãe
ainda mais. Evitável para o bebê não chorar. Inevitável seria a sensação
adquirida no primeiro sugar.
No segundo ônibus, não acontecera nada
de inevitável. Porque sentado ao meu lado, havia um senhor de imediatos 60
anos, que lia refletidamente o jornal que comprara na banca neste segundo ponto
de ônibus. A manchete que o intrigava estava escrito: “Morre em enchente,
menino de 14 anos”. Dúvidas quanto a essa questão. Poderia ser evitável. É
evitável! Não precisa de ênfase pra ser evitável. Porém, a morte do garoto não
nos consola. Era inevitável a justiça.
O terceiro ônibus revelava um mistério.
Não havia evitáveis, ou inevitáveis no terceiro ônibus. O ônibus se encontrava
vazio, só eu de passageiro, e o motorista não imaginaria o que pudesse ter
acontecido de imediato. Aquilo poderia ser um niilismo. O dilema: o niilismo
poderia ser evitável, ou seriam cartas do baralho espalhadas em cima da mesa?
Enfim, chego ao apartamento. O porteiro
não soubera onde a Letícia poderia estar. Talvez na casa dos pais. Caminhei
diretamente ao nosso quarto, o professor Linius poderia estar certo, a carta
estaria na gaveta? E estava. Intacta inevitavelmente. Sem nenhuma palavra
distorcida. O segredo: a Letícia estava grávida. Esperando meu filho, o nosso
filho! Este era o segredo para que eu retornasse. De imediato, vi a imagem do
bebê do primeiro ônibus que chorava na procura do leite sagrado. Aquele bebê em
poucos anos estaria aprendendo a andar. Seus primeiros passos valiosos. Sim!
Queria dizer a Letícia que eu a amo muito. Era isso que eu devia ter dito
quando discutimos sem justificativa.
Inevitavelmente, fui à procura dela.
Com passos de um ser preciso, resoluto no que vai fazer, com todos os seus
imediatos. Passos de um ser inevitável. E não era necessário ter três condições
imediatas pra saber disso.
(Autor: Carlos André)
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